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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A felicidade permitida no carnaval

“Um festival é um excesso permitido, ou melhor, obrigatório, a ruptura solene de uma proibição” – Sigmund Freud

 
Crescemos ouvindo que brasileiro tem samba no pé e que a ginga e o requebrado são atributos carnavalescos exclusivamente tupiniquins. Nossa cultura apropriou-se de tal forma do Carnaval que, assim como o futebol, nem lembramos de sua remota origem européia. Em intensa transformação desde as primeiras manifestações, o carnaval já teve significado ritualístico, religioso, de elitismo social nos clubes até chegar à modernidade como apelo turístico/cultural e de consumo que rende dividendos a vários segmentos.
Em que pesem todas estas variações do carnaval ao longo dos séculos, uma se manteve fiel à sua criação: o fato de ser um antídoto contra a tristeza. Na busca da felicidade a permissividade ocupa lugar de destaque, a fantasia ganha ares de realidade e tem de ser contagiante, pois errado é não gostar de carnaval. Porém, diz o poeta, “...a gente trabalha o ano inteiro por um momento de sonho, para fazer a fantasia (...) para tudo se acabar na quarta feira...”, e ai cristaliza-se um conceito que passa a falsa impressão de que somente nos momentos de festas é que podemos ser felizes.
A filosofia há séculos tem se ocupado sobre o que seja a felicidade, e a humanidade, a cada tempo, tem feito ilações das mais diversas: para Platão era um atributo da alma, para Aristóteles acrescia-se a propriedade de bens, e para muitas religiões era resultado de uma atitude contemplativa. Em outros momentos fora tida como um atributo que não estava sob o controle humano e por isto mesmo considerada como uma questão de sorte.
Por ser um sentimento de intenso valor subjetivo e uma ambição universal, a felicidade pode ser descrita como algo multiforme, e o que pode ser assim reconhecido por uns pode não o ser por outros. A psicóloga paulista Suely Gevertz faz uma interessante consideração, ela coloca a felicidade como um objeto de conquista do ser humano, e não como um atributo inato, afirmando que ser feliz é uma possibilidade no percurso da vida e que viver exclusivamente para encontrar a felicidade seria esquecer de viver. “É justamente ao elaborar frustrações, enfrentar dores, infortúnios, pesares, prazeres e também alegrias que se pode reconhecer e atingir a felicidade – ainda que de forma não duradoura.”
A felicidade como uma conquista pode ser uma concepção aceita na modernidade, mas isto requer uma ação, um movimento em sua direção. Esperar que com a chegada da festa (no caso o Carnaval) ela venha junto, deixa bem clara a situação cômoda e passiva que pode até trazer uma alegria ilusória mas que tende a acabar na quarta-feira de cinzas. Podemos construir a cada dia um instante de felicidade, uma pequena conquista que nos motive a outras tantas que venham a melhorar nossa qualidade de vida. Podemos aprender que se uma compra ou um novo emprego nos traz felicidade, estes são frutos de nossos esforços e não são a felicidade propriamente dita, pois se os perdermos, poderemos manter recursos de saúde psíquica capazes a novas conquistas.
A felicidade também significa estarmos bem ajustados frente a nossos medos a angústias, mas isto requer que pensemos sobre nossas experiências e as analisemos. Como resultado destas reflexões, poderemos encontrar respostas mais acertadas e que poderão servir de base para ações futuras muito mais seguras.
Se os momentos festivos prestam-se para a revitalização como uma injeção de ânimo, devemos ter claro que podemos nos permitir muito mais do que isto, não depositando nossas alegrias apenas em eventos externos com data e hora marcadas.



César A R de Oliveira – psicólogo

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