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domingo, 10 de agosto de 2014

PAIS EM CONFLITO COM A FUNÇÃO PATERNA

“A noção tradicional de que, para uma criança, basta a mãe caiu por terra” – Martha Mendonça - jornalista

Em mês de comemoração do Dia dos Pais, congratulo-me com todos os que têm justificados motivos para comemorações, mas escrevo, em especial, àqueles pais que nesta ocasião sentem um aperto no peito e não veem alegrias na data. Refiro-me aos que estão distantes ou separados de seus filhos.
Duas recentes produções cinematográficas brasileiras promovem fortes discussões sobre as relações de pais e filhos, mais precisamente, sobre a figura masculina: A morte inventada (disponível em DVD) do cineasta carioca Alan Minas e Nada sobre meu pai de Susanna Lira (www.nadasobremeupai.com.br). Na primeira, a abordagem se dá sobre os sentimentos de pais que após a separação conjugal ficam distantes de seus filhos, enquanto que na segunda, a temática versa sobre as consequências de não se ter registrado o nome do pai na identificação dos filhos, ou seja, como vivem crianças que sequer sabem quem são seus pais ou então, quando sabem, de seus sofrimentos por não terem por eles reconhecida esta condição.
Estudos da área da psicologia em várias partes do mundo apenas reforçam o que pode ser percebido na prática, que crianças que contam com o envolvimento dos pais no dia-a-dia têm maior autoestima, aprendem melhor e apresentam menos sinais de depressão. A psicóloga Vera Resende, da Universidade Estadual Paulista, chegou a conclusões semelhantes após acompanhar, por três anos, crianças com problemas emocionais: "Em 80% dos casos, elas não estão doentes. Só expressam dificuldades nas relações com a família, sobretudo em relação à ausência paterna", diz. Muitos distúrbios como hiperatividade, insegurança, dificuldades de relacionamentos e depressão podem estar vinculados à ausência da figura paterna na formação e na educação infantil, porém, isso não significa que os pequenos criados somente pela mãe estejam necessariamente condenados a transtornos emocionais. Fundamental é o desempenho da função paterna, a qual pode ser realizada parcialmente pela própria mãe ou então por um avô, um tio ou aquele velho amigo da família, muito embora desta forma sempre vá ter suas limitações.
Não obstante a existência de dados indicando que no Brasil após a separação do casal 95% das mães detêm a guarda dos filhos, tal fato não significa que os pais aprovem o rompimento de laços afetivos como consequência da dissolução familiar. Mesmo que venham a constituir outra família, muitos pais gostariam de poder manter suas relações filiais e as trocas de afetos com seus filhos.
Por outro lado, no documentário de Susanna, o problema focado em filhos que desconhecem seus pais transcende esta ausência e leva-nos a refletir sobre o quanto poderá ficar comprometido o desempenho do papel de pai daquele que nunca (ou pouco) o teve ao seu lado. Por mais que alguém venha a desempenhar tal figura em aspectos de afetividade, a rejeição do reconhecimento da paternidade biológica ficará como uma marca.
Ainda que os dois filmes dos quais me refiro estejam aparentemente em situações de oposição, tanto o pai que deseja o contato com os filhos (mas que esteja sendo por algum motivo tolhido) quanto aquele que sequer reconhece qualquer vínculo afetivo para com a criança que gerou, têm influências sobre o futuro de seus rebentos. Sentimentos de vergonha pela condição de ignorância da paternidade são frequentes, não raramente algumas pessoas ficam constrangidas no preenchimento de algum protocolo quando lhes pedem “o nome do pai”. Mais grave ainda foi a descoberta de Susanna ao elaborar seu documentário de que cerca de 80% de jovens infratores brasileiros não tinham o nome do pai na certidão, numa afirmação de o quanto é importante  a existência de uma figura paterna de qualidade para pelo menos se buscar um saudável desenvolvimento psicossocial.
Um interessante livro infantojuvenil sobre esta temática é de autoria de Walcir Carrasco e intitula-se A palavra não dita, o qual, se lido pelos pais, poderá auxiliar em muito na compreensão da importância de seus papéis, visto sob a ótica dos filhos.
César AR de Oliveira – psicólogo