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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

2012: PENSAR POSITIVAMENTE FAZ BEM

“...“Enganaste-te na pessoa ao escolheres um corpo para viver, cometeste um erro porque escolheste o meu”. Lance Armstrong, 37 anos

A frase acima foi proferida por um grande atleta americano logo após saber de seu diagnóstico de câncer. Num diálogo com a doença que lhe acometia com muita intensidade - pois fora diagnosticado um tumor no testículo, um no pulmão e outro no cérebro “do tamanho de bolas de golfe”- Lance Armstrong reagiu e superou-se. Após enfrentar esta luta contra o câncer, foi ainda, desde a criação em 1903 na França, o único vencedor por sete vezes consecutivas do Tour de France, (1999 a 2005) uma das provas de ciclismo mais difíceis do mundo cujo percurso no somatório das etapas chega a 3 mil quilômetros.
A forma positiva como reagiu Armstrong, motivou-o na criação de uma importante fundação que leva seu nome no apoio a vítimas de câncer e ainda na redação de dois livros de sua autoria que relatam sua façanha.
Recentemente, no ano de 1998 nos Estados Unidos, Martin Selligman, ex presidente da Associação Americana de Psicologia, deu origem a um movimento denominado Psicologia Positiva, o qual incluía psicólogos, pensadores e cientistas americanos de universidades importantes que buscavam aplicar um método científico-quantitativo a esta área. Tal movimento não se trata de uma nova Escola da Psicologia, assim como a Psicanálise, a Psicologia Comportamental ou outra, mas de uma forma de a psicologia colocar a sua atenção nos aspectos saudáveis do ser humano, diferentemente de algumas das tradicionais que focam o sintoma, a doença.
Na mesma linha de pensamento encontramos nas neurociências fundamentações de que os conceitos que estruturam nossos pensamentos ocorrem nas sinapses cerebrais, ou seja, de que mudanças comportamentais de enfrentamento a situações difíceis podem nos levar aos resultados desejados. É claro que muito disso pode ser encontrado em literaturas rotuladas de auto-ajuda, dando argumentação à contrariedade dos céticos, de que as coisas acontecem por que tem de acontecer e que só pensar de maneira diferente não vai resolver.
O Instituto Nacional de Saúde dos EUA realizou um rigoroso estudo científico sobre o tema Longevidade e Felicidade em 178 freiras de um convento no estado de Minessota. Todas mantinham um estilo de vida sem fumar e beber, seguiam a mesma dieta alimentar, usufruiam da mesma qualidade de assistência médica, enfim, padrões muito parecidos em suas vidas. Em um detalhado trabalho científico, os pesquisadores tiveram acesso aos diários dessas freiras, e, o grande achado, foi o de que aquelas que tinham registradas expressões do tipo “muito feliz, alegria, amor...” dentre outras emoções positivas, encontraram-se no grupo das que viveram até pelo menos os 85 anos de idade. Ou seja, as freiras que mais cultivavam sentimentos positivos viveram por mais tempo e com mais saúde.
Ante tantos referenciais, quero lembrar o filósofo Sêneca (séc I d.C.) que dizia que o homem preocupa-se em viver muito e não em viver bem, quando não depende dele viver muito, mas sim, viver bem. Uma concepção está imbricada com a outra pois é possível viver muito, desde que se viva bem. Então, neste final de ano, não se cobre em demasia estabelecendo metas, coisa futuras para serem atingidas, concentre-se no hoje, no aqui e no agora, na sua qualidade de vida. Por conseguinte, um dia bem vivido vai assegurar um amanhã melhor e a certeza de que ao olhar-se para o passado algo terá ficado. Não é à toa que o dia de hoje se chama “presente”, uma dádiva que poucos conseguem olhar assim: como um presente!
Pensar positivamente não é olhar o mundo com lentes cor-de-rosa, mas pode ser uma opção para darmos um colorido àquelas pessoas e coisas que insistem em permanecer na mesmice.

César A R de Oliveira – psicólogo

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

É preciso falar sobre a morte

“... o ser humano evita ir em busca do seu próprio eu por medo de se deparar com sua finitude, o que lhe gera angústia pela limitação sentida diante da morte.” Adriana Bertoletti


Durante os momentos de sessões de autógrafos da última Jornada Nacional de Literatura, destaco o do livro “Educando para a vida e a morte” – trecho em epígrafe – de autoria da passofundense Adriana Bertoletti. Como profissional da enfermagem, relata uma experiência singular de 15 anos de trabalho em Centro de Terapia Intensiva (CTI) e de sua responsabilidade como mestra,  professora que atua na formação de novos cuidadores da saúde. Só quem tem este contato diário com o sofrimento das pessoas em tratamento nos CTIs  (incluam-se seus familiares e amigos angustiados em salas de espera e corredores) e com as limitações técnicas e humanas de  uma equipe de atendimento, pode relatar com precisão um tema que nos assusta só pelo nome.
Mas como está explícito no título da obra, é também através de uma educação para a vida que o sofrimento poderá ser minimizado. A primeira grande lição que poderíamos apreender com nossas reflexões consistiria em não aceitarmos a banalização da morte. Temos notícias da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (associada a Universidades e Unicef) sobre estimativas de que morrerão 33mil jovens por assassinatos no Brasil num período de apenas seis anos (de 2006 a 2012), ou seja, 13 jovens por dia. Na mesma linha, o estudo "Morte no Trânsito: Tragédia Rodoviária" realizado pelo SOS Estradas aponta para 42 mil mortes ao ano no Brasil, numa média de 35 por dia -uma a cada 40 minutos- sem falar naquelas que acontecem em hospitais, dias depois, como consequência destes acidentes de trânsito. Todos estes dados frios (e há muito mais) transformam-se quando um pai ou uma mãe aparece na clínica psicológica com um sofrimento intenso, deprimido, com sentimentos de culpa e de incapacidade para viver por que uma destas mortes prenunciadas em “estatísticas” tornara-se realidade: perdera o filho.  
A segunda grande lição na educação para a vida seria a da necessidade de uma mudança cultural, a de aceitar que nascemos para morrer. A biologia sabe disto: as unhas de nossas mãos não são as mesmas com as quais agarramos a vida um tempo atrás; nossos cabelos já foram tantas vezes cortados que não são os mesmos de um retrato antigo; nossa pele?  Já era! Literalmente trocamos nossa casca várias vezes durante a vida. Se estas perdas nos acompanham diariamente, aceitá-las não significa inércia ou passividade, pelo contrário, podem representar uma conscientização seguida de muita ação e de trabalho para modificar um quadro banalizado sobre mortes que fingimos não ver.  
Viver é isto, um ato de morrer constantemente. Ao lançarmos nosso olhar para esta filosofia de vida, quem sabe nos tornemos mais amorosos, menos irritáveis, mais compreensivos, menos consumistas. Afinal, o tempo também nos consome a cada instante, e ficar na ilusão de que isto não esteja acontecendo, somente aumentará o impacto quando nos depararmos com a realidade.      

  
 

César AR de Oliveira – psicólogo

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Duas Histórias...



 “Eu deparei com um corpo que não pode mais nada e cheio de complicações. Em contraposição, acompanha-o uma mente sã, rápida em raciocínio, cheia de sonhos, lembranças, amores e informações...”  Luciana Scotti,

O livro Sem asas ao amanhecer (Ed. O nome da Rosa, 2003) trata da história comovente de uma jovem paulista graduada em farmácia, que aos 23 anos de idade sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) – de forma leiga, também chamado de derrame - e após dois meses em estado de coma ficou tetraplégica e incapaz de falar. Com muito esforço e vontade de viver, após incontáveis sessões de terapias de ordem psicológica e física (trabalho muscular, postural, de equilíbrio, fonoaudiologia dentre outros), ela deu novo rumo à sua vida. Movendo apenas e parcialmente um único dedo, conseguiu restabelecer aquilo que de mais precioso pode ter um ser humano: a capacidade de se comunicar. 
Associo a história de Luciana com a de um amigo passofundense que por ocasião do parto, teve uma falta de oxigenação em seu cérebro, do que lhe resultou uma paralisia cerebral e alguns danos neurológicos. Há uma grande desinformação por parte das pessoas quanto àquelas que trazem uma condição singular de uma necessidade especial. Num mundo onde não se tem tempo para muitas coisas, abreviam-se tais sujeitos classificando-os, genericamente, de PPD (Pessoa Portadora de Deficiência). Rotulados, catalogados, e listados em uma Previdência que sequer é capaz de minimizar suas dificuldades, seja com a disponibilização de medicamentos ou de práticas clínicas possíveis de reabilitá-los (ainda que dentro de suas limitações), sofrem muito.
O que difere na história destas pessoas, é que Luciana teve uma infância saudável, estudou, graduou-se e estava empregada em uma empresa transnacional, enquanto que meu amigo teve uma infância difícil, a muitas custas alfabetizou-se e sempre dependeu de seus familiares para atender suas necessidades básicas. O que os une, é que têm famílias dedicadas e que acreditam em suas potencialidades. São seres humanos como qualquer um, com sonhos, desejos, necessidade de afetos e de com quem compartilhar o mundo. Diz, melancolicamente, nosso conterrâneo: “... porque por mais que eu lute contra a minha deficiência física a vida está me tirando não só direito de ter a profissão na qual eu quero para mim, mas principalmente o direito de viver um amor, porque a falta de afetividade amorosa ocasiona solidão e um vazio muito grande em minha vida, sinto muita falta de ter uma companheira, para conversar, namorar, nos momentos em que a gente precisa de um braço para nos amparar, enfim alguém para dividir os momentos bons e ruins que a vida nos traz, mas que no meu caso é delicado e triste.”
Lamentavelmente suas condições de paralisia dos membros (total para um e parcial para outro) e a incompreensão da articulação de suas palavras por parte daqueles com os quais não convivem, os colocam em condições constrangedoras. Muitas pessoas sequer dirigem um “oi” quando os encontram, como se suas dificuldades de comunicação fossem uma via de mão dupla: “Não podendo falar não podem me entender”. Ora, meu amigo está no mundo: acessa a Internet, joga xadrez com amigos da Rede, conversa pelo MSN, lê, escreve, quer trabalhar, tem sentimentos e projeta um futuro. Luciana, sempre buscando superar obstáculos, mesmo sem poder falar e movendo (agora) com muita dificuldade uma das mãos, é autora de sua biografia e de outros livros. Como farmacêutica, mesmo em cadeira de rodas e contra todas as dificuldades, concluiu mestrado e doutorado na área da Cosmetologia pela USP, realiza pesquisas e é uma produtora de conhecimento muito importante nesta área. Não é possível que continuemos a ignorar a existência destas pessoas, e, muito menos, que os tratemos como incapazes, como “coitadinhos”.
Estas histórias de superações, inevitavelmente, fazem-me compará-los a tantas outras pessoas “pseudo-saudáveis”, as quais, quer por motivos racionais ou inconscientes, imobilizam-se dentro de seus corpos dando adeus à vida. Poderiam, com uma pequena ajuda, começar por mover um único dedo em busca de suas revitalizações.
César A R de Oliveira
Psicólogo

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Dirigir sem ESTRESSE

“Cada episódio de raiva aumenta os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, enfraquece o sistema imune e aumenta o risco de doenças cardiovasculares.” Susan Andrews – psicóloga e monja iogue
  
Como psicólogo perito pelo Detran/RS, diariamente entro em contato com pessoas que buscam a obtenção da  Carteira Nacional de Habilitação, ou ainda, com motoristas que trabalham profissionalmente no trânsito e precisam da renovação de sua licença. Trânsito, assim como futebol (ou até mais, por envolver indistintamente toda uma sociedade) é uma área em que todo mundo têm um palpite. Em Passo Fundo nos últimos anos vêm ocorrendo mudanças radicais na sinalização de trânsito, na regulamentação de vias e de velocidades, o que, por exemplo, tem agradado a gregos e descontentado a troianos. Pouca gente se dá conta de que os estudos mais clássicos sobre trânsito definem que este sistema é composto por três elementos básicos: o condutor, a via e o veículo. Quando maldizemos mudanças viárias criticando os órgãos responsáveis estamos apontando em apenas uma direção, esquecendo que o número de veículos em circulação (outro fator), somente em Passo Fundo, tem aumentado aos milhares nos últimos anos e o principal, deixando de olhar para o mais importante integrante deste complexo: o ser humano.
A psicologia voltada ao trânsito de veículos automotores existe no Brasil há 60 anos, mesmo tempo em que o processo de avaliação psicológica - antigamente chamado de psicotécnico - vem sendo aplicado. Muito embora sejamos criteriosos por ocasião da avaliação para a obtenção da permissão para dirigir, qualquer um das centenas de milhares de condutores de veículos em circulação pode, a qualquer momento, ter desencadeado um processo de estresse agudo e vir a envolver-se em infrações ou acidentes de trânsito, por exemplo.
Mais do que estar preocupado por ocasião do momento da avaliação psicológica, as pessoas devem ter consciência de que um estado anormal de saúde psíquica na condução de um veículo pode resultar em morte, em paraplegias, amputações ou tantas outras sequelas que os incapacitem por definitivo ou lhes façam perder uma pessoa querida. Mas, como não ficar envolvido por esta enorme bolha estressora que é o trânsito?  
Primeiro, não enganar-se pensando que “...estou brabo por que não acho vaga para estacionar....”. Resuma: “Estou brabo!”. A partir daí procure analisar se efetivamente é o trânsito o que lhe causa este mal estar, ou será que outras coisas em sua família, no trabalho, nas finanças lhe preocupam? A tão malfadada falta de tempo pode ser outra origem do estresse, daí a pressa em ter de achar uma vaga, ou de querer que a fila ande. Preventivamente, sabendo que o ato de dirigir nas cidades requer muita atenção e paciência, prepare-se, mude seus hábitos diários, mesmo aqueles que não perceba ter alguma relação com o trânsito. Dedique 30 minutos de seu dia para meditar ou relaxar, faça pequenos intervalos em seu trabalho para ir ao banheiro, tomar água ou café. Crie uma escala de importância para suas atividades, não faça diversas coisas ao mesmo tempo, não faça tudo também por meios eletrônicos, uma visita a um amigo ou cliente, um contato pessoal, faz diferença. E é claro, olhe para o seu prato (se é que não esteja alimentando-se em pé!), tome mais água, pratique algum exercício, dê-se um tempinho também.
Bem, para aqueles que não acharem possível proceder algumas mudanças em suas vidas vai o alerta: segundo a Organização Mundial de Saúde o estresse está entre as cinco principais causas psíquicas de falta ao trabalho e entre as que mais causam problemas sociais, tais como inimizades, separações, perdas de emprego e um forte desencadeador de quadros depressivos. É sabido que problemas cardiovasculares, e uma lista sem fim de sintomas podem ter sua origem num quadro de estresse agudo: irritabilidade, mau humor, ansiedade, inapetência sexual, gastrites, dores musculares decorrentes de tensões, envelhecimento da pele, e, com a baixa imunidade, a abertura de uma porta para tantas outras doenças infectocontagiosas.
É possível minimizar os efeitos de um estresse? Sim, é possível, basta mover-se.

César AR de Oliveira – psicólogo

domingo, 18 de setembro de 2011

INTUIÇÃO


“Após muitas horas de intensa concentração, durante as quais reviu sistematicamente todo o conhecimento que tinha acumulado, percebeu, num súbito lampejo de intuição os alicerces de uma ciência maravilhosa que prometia a unificação de todo o saber.” (Fritjof Capra) 

Em seu clássico O ponto de mutação (Cultrix 1982) Capra – em epígrafe – escreve referindo-se como algo intuitivo ao anúncio da grande descoberta de Descartes, “O Discurso do Método...” que viria a influenciar o mundo e que é a base do método científico até hoje. O próprio Descartes definia sua descoberta como uma “visão de inspiração divina” e que a tivera revelada em um sonho. Por relatos como este é que intuição pode ser definida como um termo que evoca uma associação ao que é místico, justifica o fato também de ser chamada de sexto sentido, muito atribuída ao feminino, ao divino ou ao religioso. Palavra oriunda do latim intueri, cujo significado pode ser o de “olhar para dentro”, tem sido destacada nos últimos tempos ganhando uma maior aceitação também na comunidade científica.
Sobre isto, a psicóloga americana Sharon Franquemont dá uma breve definição muito apropriada e diz: “A intuição é o conhecimento que surge sem o uso da lógica ou da razão”.  Ora, colocada no patamar de conhecimento, relega a um segundo plano quaisquer associações desta com adivinhações ou sorte. Na psicologia poderemos encontrar em Carl G. Jung (psicólogo que desenvolveu trabalhos com Sigmund Freud até que divergissem) algumas considerações sobre intuição. Segundo Jung, a intuição utiliza a psique para discernir sobre fatos e pessoas, uma vez que um ser intuitivo possui as seguintes características: observa holisticamente, confia nos pressentimentos, é consciente do futuro, é imaginativo e visionário. No ano passado esteve no Brasil o físico-quântico indiano Amit Goswani, o qual, da mesma forma que Jung, admite que além de sensação, pensamento e sentimento, a intuição é uma das quatro maneiras de o homem entender a realidade.
Atualmente a Psicologia Cognitiva apropriou-se de conhecimentos obtidos com as modernas tecnologias e deu ênfase na abordagem da intuição de forma científica, confirmando que há inúmeros processos mentais que ocorrem no nível inconsciente, à margem de nossa percepção. Desta forma, a Psicologia Cognitiva descreve a possibilidade da existência de dois caminhos para a elaboração do pensamento na mente humana: o primeiro intuitivo, que opera sem que nos demos conta, mas de forma rápida, automática, com alta carga emocional e sem exigir esforços do indivíduo, enquanto que o outro processo se dá em nível consciente, deliberado, racional e que requer esforço e atenção quando se quer utilizá-lo.
Todos nós passamos, em algum momento, por aquela sensação de que impulsivamente sabemos qual a decisão que devemos tomar, porém, racionalismos, medos e dúvidas nos conduzem para uma outra opção. Mais tarde, livres de pressão, alguns até arrependem-se de não ter “ouvido sua voz interior”.
De certa forma, uma reformulação de nossas condutas podem nos auxiliar no melhor aproveitamento de nossa intuição. Estar aberto a novas idéias nos recicla, nos oportuniza outros horizontes e isto pode ocorrer na medida em que nos presenteamos com tempos-livres propícios para novos conhecimentos. Introspecção e socialização são importantes. Cultivar o silêncio em alguns momentos nos permite refletir melhor e a dar ouvidos aos nossos pensamentos, por outro lado, termos objetivos claros e nos motivarmos a trabalhos em equipe também potencializam nossas capacidades.
Enfim, não é feio ter intuição e nem demérito considerá-la em algumas decisões de nossas vidas. É muito importante, porém, que tenhamos profundo conhecimento sobre nós mesmos, de forma que estejamos mais confiantes quando optarmos por dar atenção a ela.  

César A R de Oliveira – psicólogo

domingo, 4 de setembro de 2011

Os gaúchos e seus mitos


“O pampa era a matriz da barbárie americana, nele só sobreviviam os que Walter Scott chamou de ‘cristãos selvagens’, os gaúchos...” (Domingo Sarmiento, 1845)


Há um consenso de que gaúcho é o habitante da Pampa, cuja vastidão compreende em sua maior parte a Argentina e depois o Uruguai e o sul do Brasil, mais precisamente no Rio Grande do Sul. E é na literatura argentina que vamos encontrar belíssimas obras gaúchas como Facundo, de Domingo Sarmiento, Martin Fierro, de José Hernandes e Don Segundo Sombra, de Ricardo Guirãldes, as quais retratam este tipo indomável e de vida rude. Sarmiento, que foi presidente argentino entre 1868/1874 tinha uma ousada plataforma eleitoral, talvez a considerada mais importante para a época: “Desarvorar a gauchada das províncias argentinas a tiro e a canhonaço, se for preciso...”. Daí que Hernandes cria o seu Martin Fierro como o mito gaúcho anti-herói que acaba sendo tomado por modelo pelo povo argentino e que serviu de inspiração para Che Guevara. Tal obra foi escrita durante seu exílio na fronteiriça e gaúcha Santana do Livramento, depois de liderar um levante frustrado contra aquele presidente.
Nosso olhar para o que representa o gaúcho de hoje tem muito deste mito de ideal libertário de Martin Fierro e de suas habilidades que o tornaram expressivo. Em qualquer parte do mundo, nas mais diferentes culturas, vamos encontrar invariavelmente um herói que parte em busca de algo e que, ao regressar, tendo sido bem sucedido, estará psicologicamente transformado: já não é o mesmo indivíduo que partiu, mas alguém que atingiu um grau superior de sabedoria e que conseguiu aprender com a experiência vivida.
Quantos de nós um dia saímos das casas de nossos pais cheios de sonhos e de projetos para a nossa saga?  Quem em algum momento na infância não idealizou um herói? Precisamos ter conhecimento de que o êxito de nossas vidas está muito fundamentado naquilo que a psicologia chama de resiliência. Ou seja, um conjunto de processos sociais e intrapsíquicos que possibilitam o desenvolvimento saudável do indivíduo, mesmo este vivenciando experiências desfavoráveis. É nesta luta contra as adversidades que vamos encontrar alguns aspectos de características de personalidade que nos diferenciam, tais como a auto-estima, flexibilidade, e habilidade para a resolução de conflitos, coesão e bom relacionamento na família. Também é de muita importância sobre o quanto dispomos de suporte externo em nossos grupos de amigos, na escola e na comunidade, os quais encorajam e reforçam nossas estratégias. Desta saudável interação pode resultar nosso êxito.
Alguns autores vão ainda descrever o termo resiliência como forças psicológicas e biológicas exigidas para atravessar com sucesso as mudanças da vida. Assim, o indivíduo resiliente é aquele que tem habilidades para reconhecer a dor, perceber seu sentido e tolerá-la até resolver os conflitos de forma construtiva. É quando o indivíduo, exposto as adversidades, violências e catástrofes, consegue se recuperar psicologicamente. O desenvolvimento de capacidades de resiliência nos sujeitos pela sua capacidade de autoregulação e autoestima, ajuda as pessoas a descobrirem as suas capacidades, aceitá-las e confirmá-las positiva e incondicionalmente, bem como, de se tornarem mais confiantes para enfrentar a vida do dia-a-dia, por mais adversa e difícil que se apresente.
Tão importante para a história da psicologia quanto Freud, o psicólogo Carl G. Jung afirmou em algum momento que o homem é visto tanto à luz de sua problemática atual como à luz de sua história, como um ser dotado de potencialidades. Ora, explorar nossas capacidades e competências e adequá-las aos nossos objetivos nos tornarão mais fortes e motivados para nossos enfrentamentos, e, assim como o tema desta Semana Farroupilha (2010)- Os farroupilhas e suas façanhas -  o mais importante mito gaúcho, Martin Fierro, também era conhecido como “O façanhudo”.
Portanto, sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra.

César AR de Oliveira – psicólogo

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Sobre algumas mentiras...




“Enganar a nós mesmos permite-nos manipular egoisticamente os que nos cercam e permanecer convenientemente inocentes perante os próprios olhos.” David Smith - psicólogo


Um dos significados dados ao “Primeiro de Abril” está relacionado à enganação, ao Dia dos Bobos, à mentira. Muitas brincadeiras são feitas em nome destas mentiras, as quais, em outros contextos, tendem a ser atitudes reprováveis. Educamos nossos filhos com afirmações como a de que mentir é feio e que não deve ser feito, no entanto, basta uma criança um pouco atenta para nos apanhar em contradições. Toca o telefone de casa e antes mesmo de atender o pai diz: “Se for para mim(sic) digam que não estou...”, sem preocupar-se com as consequências de sua fala.
A dissimulação é um artifício, segundo alguns biólogos, empregado por muitas espécies de seres vivos, de vegetais a seres humanos, sendo entendida até mesmo como inata a todos nós. Não é preciso mais do que abrir um livro, ver um filme, assistir à televisão para nos depararmos com toda a sorte de ardis que o homem é capaz de criar. Diversos profissionais que estudam o comportamento humano relatam as mais prolixas pesquisas e experiências que comprovam atitudes enganosas em diferentes idades, classes sociais e culturais. Mente-se para obter uma vantagem, para não ser multado no trânsito, para justificar um atraso, para obter prestígio, para uma conquista amorosa e para tantas outras situações cotidianas. Mente-se também de forma não verbal escondendo a verdade ao utilizar-se de maquiagens, de cirurgias consideradas cosméticas, ao cobrir-se de objetos de grife ou então ao aparentar-se condição social elevada em um flamante carro novo (enquanto se evita o contato com a escola dos filhos que está com os pagamentos atrasados...).
Mas, embora de uso comum e tolerada enquanto não nos cause problemas (mais do que aos outros) a mentira tem um limite. Há pessoas que enredam-se tanto com mentiras que acabam autoenganando-se, acreditando até mesmo que estejam falando a verdade, tornando-se persuasivas. Agem assim como uma forma de fuga à realidade, pois é melhor acreditar no fantasioso uma vez que lhes causa menos sofrimento. Todavia sempre emerge uma ponta de verdade que faz com que essas pessoas sofram, pois empenham muita energia psíquica para manterem as condições enganosas. O temor da vergonha de que venham a ser descobertos, as frustrações decorrentes disto, tudo acaba por gerar um mal estar a ponto de causar manifestações fisiológicas como dores de cabeça, sudorese, taquicardia, alteração na pressão arterial dentre outras.
Agir sob o signo da mentira, leva a pessoa a querer manipular os outros e, em muitas vezes, a comportar-se de forma desrespeitosa, o que pode gerar mais adiante um sentimento de culpa (quando não se tratarem de psicopatas). Quando confrontada a pessoa mentirosa pode tornar-se irritada e agir tempestuosamente, gerando um clima de desconforto e de constrangimento até mesmo para outros que estejam no ambiente. Há ainda as que mentem para ocultar um comportamento compulsivo, como o de uma compra inadequada, o hábito de beber as escondidas ou a gula por doces ou comidas, por exemplo, mas que sofrem caladas por não poderem revelar a verdade.
Bem, nestes casos, o doloroso encontro com a realidade passa por uma psicoterapia voltada ao entendimento de tal comportamento, ao estudo e a análise sobre a influência dessa conduta na vida do sujeito e sobre o quanto lhe tem sido prejudicial. Alguns perfis de personalidade são mais propensos a apresentarem características que o jargão médico chama de “mitomania”, ou seja, a utilização da mentira como uma forma de amenizar a vida. Mas com esforço, dá para conviver com ela sem sofrimentos.
 

César AR de Oliveira – psicólogo

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Derrame, uma das doenças que mais mata!

“Quero enviar uma mensagem a todos os que sofreram um derrame: não se deixem abater. Levantem a cabeça, façam uma revisão de seu padrão de vida, sigam o tratamento, tenham ânimo”.(Joãosinho Trinta, 73 anos, carnavalesco).

Em novembro de 2004 o carnavalesco Joãosinho Trinta virou notícia, não por ter sido nove vezes campeão do carnaval carioca, mas por ter sofrido seu segundo derrame (AVC – acidente vascular cerebral). O AVC é a segunda principal causa de morte no mundo, e, segundo o Ministério da Saúde, só nos quatro primeiros anos deste milênio - juntamente com o infarto - matou mais de um milhão de pessoas no Brasil. Depois vêm as causas naturais e mortes por falta de assistência, o câncer e as causas externas: acidentes, homicídios, suicídios entre outros. Existem dois tipos de derrame, os isquêmicos, que acontecem pela obstrução de uma artéria por um coágulo de sangue ou pelo acúmulo de placas de gordura e os hemorrágicos, geralmente decorrentes de rompimentos ou de dilatação de artérias que acabam por afetar a estrutura do cérebro e podem ser fatais. De cada cinco derrames, quatro são do tipo isquêmico, e, segundo a Organização Mundial de Saúde, o derrame mata cerca de 15 milhões de pessoas anualmente no mundo.
Cada minuto é vital quando se precisa de atendimento decorrente de um AVC. A Associação Americana de Derrame sugere que o atendimento em até 45 minutos após os primeiros sintomas seja o mais recomendado, e limita em até 3 horas para a aplicação de um remédio trombolítico, a fim de que haja uma redução de até 30% do risco de seqüelas. Todavia, nos Estados Unidos levam-se em média 12 horas para o atendimento hospitalar, enquanto que no Brasil apenas 1/3 dos pacientes recebem atendimento em até três horas. Por uma questão lógica: se temos muito mais tempo para buscarmos alguma forma de prevenção, por que correr atrás de alguns minutos ou de poucas horas após o derrame para tentar minimizar suas conseqüências?
Adotar medidas preventivas para o AVC não significa ficar livre de riscos, e a psicologia também pode contribuir para com a prevenção. Estudos apontam as duas principais causas de AVCs (excluindo-se a propensão hereditária): a obesidade e o tabagismo. Se considerarmos que a obesidade é multifacetada, mas que nela estão imbricados hábitos nada saudáveis de alimentação, compulsões alimentares, baixa auto-estima que impedem a prática de exercícios físicos, quadros depressivos pela condição de obeso dentre outros, e o tabagismo como dependência química/psíquica, veremos que a psicoterapia pode dar sua contribuição para a minimização do número de vítimas de AVC.
A hipertensão é a principal causa de derrames, pois pessoas que tem pressão arterial elevada correm três vezes mais o risco de ter o problema, enquanto que quem fuma, o dobro. O agravante é para mulheres fumantes, pois se estiverem fazendo uso de anticoncepcionais tornam-se potencialmente vulneráveis. É mister ter cuidados também com o índice elevado de colesterol, com diabetes não diagnosticada e com a obesidade.
Além destas principais causas orgânicas não se deve ignorar as de origem emocional que desencadeiam alterações fisiológicas como altas cargas de neuro-químicos que sobrecarregam o sistema cardiovascular, por exemplo. Notícias impactantes, perdas imensuráveis, eventos expressivamente traumáticos podem afetar tão intensamente o corpo e resultar em um AVC.
Dentre as seqüelas físicas mais comuns no pós-AVC encontram-se a hemiparesia (paralisação de um dos lados do corpo), as alterações visuais e da fala, e ainda alterações cognitivas, sendo as mais freqüentes da memória, da percepção, da atenção, do raciocínio lógico e da leitura.
Por toda a mudança que decorre na vida das pessoas atingidas (limitações físicas, de comunicação, situação de dependência) em aproximadamente 30% dos pacientes ocorrem casos de depressão pós-AVC. Outras reações bastante comuns são o aparecimento da labilidade emocional - onde a pessoa chora ou sorri de forma exagerada ou sem motivo aparente - a ansiedade, agitação, irritabilidade, fadiga, falta de iniciativa, de motivação ou de interesse nas atividades, apatia e explosões de raiva.Todas estas alterações físicas, cognitivas e comportamentais dificultam a evolução funcional podendo gerar também um maior declínio cognitivo.
Dentre pessoas conhecidas que sofreram AVCs e que recuperaram-se, poderíamos citar o cantor Sérgio Reis, o Papa Bento XVI (em 1992), o cantor e compositor Edu Lobo, o ex-primeiro ministro de Israel Ariel Sharon, o ex-jogador de futebol da seleção brasileira Márcio Santos dentre tantos, mas, reitero, muitos morrem e um número ainda maior fica com seqüelas incapacitadoras ou ainda com graves limitações.
Como dispomos de muito mais tempo para a prevenção do que para o socorro durante um AVC (quem garante que estaremos acompanhados para sermos socorridos?), é importante fazermos algo o quanto antes, e isto passa por uma mudança de hábitos que para muitos parecerá impossível fazer sozinho. Atividades físicas regulares, alimentação equilibrada, livrar-se do cigarro e um controle emocional adequado, são importantes apoiadores para uma vida saudável, melhor ainda se orientados pelos respectivos profissionais.    

César A R de Oliveira – psicólogo
  

segunda-feira, 6 de junho de 2011

BIPOLARIDADE: altos e baixos em cada pessoa


“... cada vez que alguém reclamava da minha conduta, era desafio, mas cada vez que alguém dava carinho, me desarmava; (...) cada vez que tinham paciência, mesmo eu teimoso feito uma mula, eu cedia; por isso, dêem amor, dêem carinho, escutem com o coração.” João H. M. de Ávila

O texto em epígrafe foi extraído do livro Um Bipolar que deu certo... (Ed. Do Autor, 2006), relato de uma vida conturbada pelo Transtorno de Humor Bipolar. João Ávila é gaúcho e no decurso de sua obra nos apresenta sua história desde as brincadeiras de infância, acontecimentos na escola, adolescência, amores e desamores, vida adulta, trabalho, relações sociais e o quanto seu transtorno de humor esteve presente em sua vida sem que ele soubesse. Entre perdas (que foram muitas) e ganhos, somente na idade adulta – por volta de seus 30 anos - é que reconheceu a necessidade de buscar orientação profissional, a qual veio acompanhada do diagnóstico, de medicação e de recomendação para acompanhamento psicológico. Hoje, João Ávila é um empresário que conseguiu conciliar uma vida produtiva com afetividade, ao mesmo tempo em que encorajou-se para escrever em livro sua experiência, muito motivadora e esclarecedora para aqueles que lidam com a doença ou que tenham amigos e familiares em tal situação.
O Transtorno de Humor Bipolar já foi chamado de Psicose Maníaco-depressiva. Trata-se de um transtorno mental onde o humor assume uma autonomia que alterna entre dois pólos, altos e baixos, positivos ou negativos, mas que antagonizam-se numa expressão diametralmente oposta de comportamentos. Assim, em momentos de euforia (pólo positivo) a pessoa encontra-se com muita energia, agitação, agressividade, impulsividade, e tende a distrair-se facilmente, o que pode pôr em risco sua segurança e a de outros. Já nas ocasiões de momentos depressivos (pólo negativo) as principais características poderiam ser descritas como apatia, desânimo, tristeza acentuada, ansiedade ou mesmo falta de prazer. É claro que estas poucas descrições são de sentimentos e comportamentos pelos quais todos passamos, não significando necessariamente que manifestá-los tipifique um quadro clínico.
Não só as alterações comportamentais devem ser observadas, acontecimentos, como por exemplo, ser demitido, perder todos os bens, abusar da álcool e drogas, ser abandonado pelo cônjuge e pelos amigos, pela família, cometer infrações de trânsito, ser preso ou envolver-se em brigas são fortes indícios de que algo não vai bem. Não é preciso esperar que o comportamento manifesto comece a dar indícios de prejuízos de toda a ordem para que os familiares mais próximos busquem algum auxílio especializado. É muito importante a participação de familiares, amigos, colegas de trabalho ou de estudos, pois é bastante freqüente a pessoa acometida da bipolaridade negar a doença, ou mesmo, nem perceber o que esteja acontecendo. É conveniente lembrar que a tentativa de suicídio é 60 vezes maior entre os bipolares do que na população em geral.
Se considerarmos seus diversos espectros, a bipolaridade pode ser classificada de acordo com sua gravidade em maior ou menor intensidade. No entanto, uma pessoa acometida de uma bipolaridade leve mas que não esteja diagnosticada e em tratamento, pode vir a ter muito mais prejuízos e seqüelas do que outra, que esteja num espectro mais intenso da doença mas que conta com acompanhamento médico e psicoterápico. Outra verdade é que o temperamento forte do bipolar pode impulsioná-los a muitas realizações, basta que tenham uma real noção da dimensão que lhes afeta. Caso tivessem sido diagnosticados em suas épocas, muito provavelmente Elvis Presley, Marilyn Monroe, Elis Regina, Cazuza, Renato Russo, por suas sensualidades, criatividade, intensidade emocional, poderiam ser considerados bipolares. Não dá para esquecer ainda que o abuso de drogas, atividade sexual não segura e aventuras ousadas demais também lhes eram característicos. Tiveram seus momentos altos e baixos.
O diagnóstico correto, o uso de medicamentos, o acompanhamento psicoterápico, carinho e amor, podem dar uma boa qualidade de vida a pessoas com transtorno bipolar, minimizando assim os efeitos negativos da doença.

César A R de Oliveira

segunda-feira, 23 de maio de 2011

A importância dos animais para a psicoterapia

“Quando Ulisses retorna a Ítaca após enfrentar os inimigos e a fúria dos deuses, ele verte lágrimas de emoção ao reencontrar seu velho cão Argos, o único a reconhecer o rei quando este chega trajado como um mendigo.”  in A Odisséia de Homero

A relação entre homens e animais faz parte da história da humanidade e sua ocorrência se dá nas mais diversas funções, desde a sua utilização para a tração, para a caça, locomoção, pastoreio, guarda, companhia dentre outras, além do que, é um fenômeno universal em distintas culturas com suas peculiaridades. Atenho-me a escrever sobre a aproximação/afinidade entre animais e seres humanos, prática descrita já em 370 a.C. por Hipócrates quando recomendava a eqüinoterapia como forma de recuperação do tônus muscular e de bem estar regenerativo à saúde.
Há na literatura vários relatos de pesquisas e de resultados do benefício que tal entrosamento pode trazer independentemente do animal que esteja em questão, e estes, podem ser os tradicionais cães e gatos bem como chinchilas, coelhos, tartarugas e até mesmo lesmas. Muitas são as conseqüências decorrentes, pois a simples presença de um animal pode evocar processos mnemônicos e cognitivos que ajudam, por exemplo, uma pessoa idosa a relembrar fatos passados e com isto ter despertadas emoções, enquanto que outros animais possam servir como sensibilizadores de funções táteis, olfativas ou de apoio contra-fóbico. Por outro lado, a interação entre cães e humanos, objeto de alguns estudos científicos, comprovou a diminuição de níveis de estresse, de pressão arterial, de colesterol e de casos de depressão, além de outras melhoras em muitos daqueles que se envolveram nestas relações. A companhia de um animal exige cuidados diários os quais, além das decorrentes atividades físicas (tratar, escovar, lavar, sair passear) permitem uma troca afetiva entre ambos, e é nesta oportunidade de uma comunicação não-verbal que se expressa a sinceridade. Em outras situações, muitas vezes as palavras ditas por alguém podem não manifestar seus reais sentimentos, ou então, estarem em discordância com suas expressões corporais, o que pode não acontecer quando estas são dirigidas aos animais.
A terapia mediada (ou assistida) por animais é multidisciplinar e serve-se a vários propósitos, sejam eles motivacionais, educacionais ou fisioterápicos, mas presta-se também para a psicologia como forma de apoio às melhorias em comportamento social ou reabilitações cognitivas e emocionais. Isto não quer dizer que a simples presença de um animal em casa seja terapêutica, mas sim, que a forma como se dá este convívio, quando de boa qualidade, serve como excelente instrumento para a potencialização da psicoterapia. É sabido que as pessoas cuidadoras de animais obtém melhores resultados psicoterápicos por estarem mais propensas às manifestações de sentimentos e à sua compreensão.
Muito cedo, durante uma fase de suas vidas, as crianças precisam afastar-se das mães para que seu processo de individualização (tornarem-se indivíduos) transcorra. É muito comum a entrada em cena do que o psicanalista inglês Donald Winnicott chamava de objeto de apego, de presença constante e como substituto da mãe, o qual pode ser exemplificado pelo paninho de dormir, o bichinho de pelúcia ou algo com esta função. Porém, num momento seguinte, o objeto que cumpre este propósito de transição precisa deixar de existir como tal, de maneira que os sentimentos de insegurança, de ansiedade ou de angústia da criança sejam naturalmente superados. Quando a criança tem acesso a um animal de estimação, seu processo de individuação e seu amadurecimento tendem a tornarem-se mais facilitados. Assim como Winnicott, Freud assegura que as crianças brincam também para controlar a ansiedade e organizar suas idéias e impulsos, e que a criança não encontra diferença entre sua própria natureza e a dos animais. Então, por imaginar (durante um período da infância) que os animais possam falar e pensar projetam neles sentimentos por pessoas próximas, servindo então de substitutos das figuras parentais. Considerando que não dá para puxar o rabo de um cachorro como um brinquedo e nem arrastá-lo pela sala, a projeção não é passiva, assim a criança aprende a lidar com as frustrações a as diferenças individuais.
De certa forma, sem as barreiras que o convívio social coloca – já que o contato físico entre humanos nem sempre é bem aceito – pessoas adultas conseguem ser um pouco mais sinceras com seus bichos de estimação quando lhes dão afago e expressões de sentimentos. O mesmo vale para aquelas pessoas que têm “barreiras psíquicas” e que encontram dificuldades em tocar outras pessoas, sintomas de inibições ou de angústia que quase as paralisam, mas que conseguem ser espontâneas com seus animaizinhos.
Assim, mais do que como um animal de companhia, nossos animais de estimação podem funcionar como motivadores e receptores de afetos, catalisadores de sentimentos e de expressões. As pessoas que mantém boas relações com eles estarão muito mais sintonizadas para a percepção do mundo que lhes acerca, e, desta forma, mais capazes de melhor usufruir da psicoterapia.

César A R de Oliveira – psicólogo