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segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

O SENTIDO DA VIDA

O mês de dezembro nos leva sempre à mesma exclamação: “Nossa, já está terminando o ano!!!”, como se fôssemos pegos de surpresa, como se não víssemos a cada final de semana ou feriado prolongado (e desejado) a sua passagem. Referindo-nos ao título, tomemos o significado da palavra sentido (a qual possui mais de uma dezena de sinônimos) e falemos dele sob o ponto de vista de direção, perguntando sobre para onde dirigimos nossas vidas, para qual sentido?
Ao pensarmos assim veremos que não é o tempo que passa e nos arrasta consigo, somos nós quem nos direcionamos na vida, para cima ou para baixo, para o bem, para o mal, para a felicidade, para a tristeza.... E quando pudermos compreender que trata-se de uma escolha - isto mesmo, até a infelicidade tem a ver com nossas escolhas! – e que o rumo que damos pode ser mudado a qualquer instante, entenderemos que não somos vítimas do destino, do acaso.
A todo o momento somos sobrecarregados de informações, enxurradas de mensagens, vídeos e áudios, e passamos parte expressiva de nosso tempo olhando para fora, para os acontecimentos dos outros. É lógico que quando dermos um pouco de atenção para conosco poderemos levar um susto; veremos como os filhos cresceram, como nossos cabelos branquearam (se é que não caíram), o quanto envelhecemos... Não podemos nos perder nesta ilusão de que a vida está lá fora deixando de nos olharmos.
Uma eminente psicóloga nos diz que a vida é uma experiência para vivenciarmos o amor. Mas cuidado com a armadilha de que amar é uma relação para com o outro (para fora novamente), o que não deixa de ser verdade, todavia, só poderemos dar aquilo que tivermos. Dou-me amor em quantia suficiente para que eu possa então amar ao próximo? Este é um dos sentidos da vida, a minha capacidade de dar amor a mim mesmo, amar-me. E qual o grande ensinamento do Mestre, senão o de amar ao próximo como a si mesmo? Um amor justo, equilibrado, proporcional. A conclusão óbvia é a de que o primeiro amor é o autoamor, isto fortalece nossa estima, gera confiança e segurança para aí sim, caminharmos em direção ao outro.
Sempre que estivermos atentos à maneira como dirigimos nossas vidas, estivermos vigilantes, pequenas correções no rumo se farão necessárias, o que naturalmente exigirá menos esforços, pois as atitudes sendo mais imediatas bastarão. Quando procrastinamos deixando tudo para depois, o esforço para a correção do sentido da vida, a direção para a qual nos conduzimos, será sempre maior.
Assim, às portas de um novo ano, avalie qual o sentido de sua vida, corrija o rumo (sempre é necessário) e siga em frente, ame-se. Boas Festas e Feliz ano de 2017.


César A R de Oliveira – psicólogo
saude_mental@outlook.com

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Jung: Em busca da alma



“Minha alma, onde estás? Tu me escutas? Eu falo e clamo a ti – estás aqui? Eu voltei, estou novamente aqui – eu sacudi de meus pés o pó de todos os países e vim a ti, estou contigo; após muitos anos de longa peregrinação voltei novamente a ti.” Este diálogo que Carl Gustav Jung trava consigo e que está descrito em O Livro Vermelho nos leva a muitas reflexões, pois fora escrito por ele em outubro de 1913 numa época em que aos 40 anos de idade já havia alcançado fama, dinheiro, poder, saber e considerava-se muito feliz. Mesmo tendo presidido por um período a Sociedade Médica Internacional para Psicoterapia e sido um psiquiatra de renome, sempre lhe incomodaram questões da ordem do sagrado, do religioso, e, por incluí-las em sua psicologia, acabou rompendo suas relações com Sigmund Freud. Ainda hoje há, infelizmente, quem diga que religião e ciência não podem andar juntas.
Se fizermos uma leitura deste lindo texto entendendo por “alma” o Eu interior, teremos aí a formulação de uma grande busca à nossa consciência e o enriquecimento em autoconhecimento. Este novo encontro - depois de tirarmos o “pó” daqueles lugares por onde andamos e que nos impregnou - sugere que é preciso nos livrar das impurezas que agregamos por onde passamos, dos maus hábitos, das más ideias, maus pensamentos, de toda aquela carga inútil que nos dificulta na jornada. Quantas vezes nos afastamos de nossos desejos – de brincar com os filhos, de ficar com a pessoa amada, de descansarmos – em detrimento de exigências do trabalho e de compromissos os quais, no final, não nos levaram ao sucesso, ao dinheiro ou ao crescimento que almejávamos? Tempo perdido; é preciso que voltemos ao nosso Eu para um recomeço, e nunca é tarde. Segue Jung em seu diálogo interior: “... mas uma coisa precisas saber, uma coisa eu aprendi: que a gente deve viver esta vida. Esta vida é o caminho, o caminho de há muito procurado para o inconcebível, que nós chamamos divino. Não existe outro caminho. Todos os outros caminhos são trilhas enganosas. Eu encontrei o caminho certo, ele me conduziu à ti, à minha alma.” Há um conceito universal chamado “A Jornada do Herói”, o qual caracteriza-se por aquele que sai de suas origens (casa, vila, cidade) e após partir submete-se a uma iniciação e vive uma aventura para só depois retornar ao convívio com os seus. Grandes vultos da história, da mitologia e da literatura vivenciaram este reencontro proposto por Jung, e isto sugere um desafio muito interessante a nós mesmos, partirmos para nossa jornada com a finalidade de nos encontrarmos.
O mundo nos envolve com sua rotina, com os compromissos, com as contas a pagar, a eterna sensação de falta de tempo, e tudo isto nos afasta do sagrado que há em cada um de nós e que muitas vezes fica esquecido. E o que acontece? Na maioria das vezes só paramos e olhamos para nós quando estamos doentes, cansados, com uma vida sem graça. É preciso dar o mínimo de atenção a nós mesmos procurando encontrar o equilíbrio que nossa saúde merece para bem vivermos esta vida.

César A R de Oliveira
Psicólogo – saude_mental@outlook.com

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

GRUPOS DE WHATS APP: A proximidade que pode afastar

Na prática terapêutica um tema tem sido recorrente nos últimos tempos: o cliente relata algum mal entendido ocorrido em postagens em grupos de “relacionamentos” e que alguém ficou ofendido e saiu do grupo; o final da história todo mundo conhece... Seja a finalidade do grupo do aplicativo para integrar colegas de trabalho, de condomínio ou familiares, o ponto em comum é que de certa forma colabora para que se mantenham os contatos, pois, mesmo não postando algo, pode-se ler as manifestações dos demais. Um edifício de mais de oitenta condôminos que tinha em suas assembleias semestrais não mais do que quinze pessoas, agora anda em alvoroço com o grupo criado e as trocas de farpas entre muitos que, sequer alguma vez estiveram presentes em reuniões para, cara a cara, ou, olhos nos olhos, poderem dialogar. E o mesmo acontece entre familiares quando alguns residem até mesmo em outras cidades: o que poderia servir para integração acaba por prestar-se antagonicamente.
Não sou avesso às tecnologias, mas sou um usuário que procura fazê-lo com bom juízo, tirando o melhor proveito. Quero dizer que a falta de diálogo tem gerado muitos sofrimentos sem que alguns sequer percebam. Alguém me disse: “... mas eu mandei uma mensagem, ele que não leu!”. Isto não é diálogo, é simplesmente escrever um bilhete e manda-lo virtualmente, não substitui a presença, o aperto de mãos, um abraço, o estar à frente de um sorriso (ou até mesmo de uma cara carrancuda). A capacidade da comunicação e as propriedades da fala e da escuta atenta são ótimas ferramentas quando bem utilizadas. As emoções que surgem nos encontros (sejam de alegria e prazer ou de tensão e medo) todas, nos constituem e nos amadurecem, servem de aprendizado para que repassemos aos nossos filhos, irmãos, amigos, colegas, elas nos transformam.
Mas como conviver nesta cibernética sem esquecer nosso lado humano? Simples: tendo a todo o momento a consciência de nossa humanidade. Atitudes de tolerância, compaixão, compreensão, aceitação, são importantes exercícios para nosso bem estar. Mas está pensando em praticar isto com os outros? O que estou propondo é que primeiro tenha esta experiência consigo mesmo: seja mais tolerante com seus erros, tenha mais compaixão com seus sofrimentos (eles estão ai para que sejam pensados, repensados e transformados!); mais compreensão ao lembrar-se de que nem todos pensam como você, e, finalmente, - dito popular - a aceitação de que aquilo que não puder ser remediado, remediado está.
Conviva virtualmente com estes aplicativos, mas apenas o necessário, pois excessos de grupos não nos tornarão mais aceitos, mais queridos, pelo contrário, tomarão muito de nosso tempo dificultando que olhemos para nós mesmos. Agora, não seria interessante – mesmo que pelo Whats App – convidar um amigo para um encontro, um cafezinho, um tempo para efetivamente, conversarem? Melhore suas relações, melhore a si mesmo, aproxime-se!
César A R de Oliveira – psicólogo
saude_mental@outlook.com

METAMORFOSE AMBULANTE

Nos anos 80 o atual treinador da seleção brasileira de vôlei, Bernardo Resende, Bernardinho, era um levantador reserva daquela seleção, papel secundário e discreto (mas não menos digno) e que lhe rendeu muita experiência e oportunizou aprendizagem para chegar aos dias de hoje como treinador bicampeão olímpico. Após a conquista do título desta olimpíada no Rio de Janeiro, proferiu a seguinte frase: " Quando eu gritava com a geração passada, eles se sentiam estimulados em me provar que eram capazes. Esse time não, se eu passar a tensão pra eles, eles absorvem, ficam nervosos e não respondem bem." . Deixa claro que nos últimos anos adotou um perfil diferente para conduzir os jogadores, mudou, e é sobre isto que escrevo: nossa capacidade de mudanças.
Reconhece o treinador que a atual equipe é diferente daquela da geração anterior, foi necessária uma transformação, afinal, os tempos mudaram, o momento é outro e as exigências também. Diariamente somos forçados a muitas adaptações por cobranças externas a nós (aprender a utilizar um computador, um smartphone, trocar o talão de cheques pelo cartão de crédito...) e nos descuidamos com outras mudanças que deveriam partir de nosso Eu. Falta de paciência, agressividade, ansiedade, insegurança, pressa, falta de tempo, dirigir no trânsito, se tudo isto está nos atrapalhando o que nos impede de mudar? Novas posturas que nos beneficiariam deixam de ser adotadas apenas por faltas de atitudes, de nossas atitudes! O livro Transformando Suor em Ouro, escrito pelo treinador há dez anos, traz muitas lições de atitudes que poderíamos adotar para cada situação, mas o título da obra por si só é emblemático e diz tudo: é preciso suar para obter uma transformação.
Quantas equipes não prosperam, empresas vão à falência, governos beiram a ineficiência, simplesmente por que não se permitem mudanças, continuando a entoar o mantra “Eu sempre fiz assim...”? Agora vamos aos núcleos familiares: quantos casamentos vão mal, quantas relações de pais e filhos são estressantes unicamente por que algumas pessoas mantêm-se inalteradas em suas convicções e posturas? Precisamos nos permitir, quem sabe, como dizia Raul Seixas, ser “ ... uma metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.” Quando mudamos, o mundo muda.
Quando encontramos no consultório pessoas dispostas a deixar de lado uma vida infeliz e de sofrimentos o trabalho psicoterápico flui com muito mais naturalidade, e, havendo cooperação, disposição e principalmente o entendimento de que as mudanças na vida decorrem de resultados de atitudes, o suor (e não raras vezes o choro) efetivamente vira ouro! Aposte em si, em sua capacidade de mudar, com certeza, muito daquilo que aparenta ser um problema hoje, com novas atitudes, deixará de sê-lo.
César A R de Oliveira – psicólogo

O ANTÍDOTO PARA A CULPA É O PERDÃO

Aprendemos desde cedo que uma forma de ser educado é a de pedir “des-culpas”. Então, sem nos darmos conta, vamos pedindo o tempo todo para que nos tirem a sensação de culpa por algo que fizemos ou pensamos ter feito de errado. A reflexão que se propõe é para chamar à atenção de que nos momentos em que nos sentimos culpados, estamos, na maioria das vezes, dirigindo nossa frustração, raiva ou indignação contra nós mesmos! E isto é justo?
Se durante o desenvolvimento infantil é que se estrutura a personalidade, é na vida adulta (a maior parte de uma existência) que se encontram os reflexos de situações das culpas da infância. Quantas vezes nos desanimamos quando crianças tendo de agir como nossos educadores queriam, para agradar, para melhor conviver, sem termos no entanto a possibilidade de sermos quem somos. E como isto acontece nos dias de hoje? Consigo efetivamente ser em meu trabalho o que eu penso que sou? Nas relações sociais e familiares, represento um papel acumulando culpas ou procuro uma forma de minimizar este sofrimento?
Em sessões de psicoterapias é recorrente ouvirmos de pessoas de todas as idades queixas de algum sentimento de culpa, e estas são relatadas sob a origem nas mais variadas circunstâncias e ocorridas em qualquer momento da vida, mas que as fazem sofrer hoje. A regra é culparem-se tanto por ação como por omissão, pois tanto faz se algo foi feito ou deixou de sê-lo, resta que sentem-se culpados.
É de uma clareza racional a afirmação de que todas as pessoas erram, mesmo querendo acertar. Por outro lado, ainda que o erro seja intencional (por vingança, raiva, impulsividade) ele pode em algum momento gerar também um sentimento de culpa e posterior sofrimento ao seu autor. Uma pessoa acometida de culpa pode somatizar, ou seja, desenvolver doenças que a incapacite para o trabalho ou para o convívio social, o que acaba igualmente por perturbar sua família, colegas de trabalho ou de escola.
Mas como desculpar-se? Numa referência ao título deste artigo, a melhor forma de poder lidar com sentimentos de culpa é utilizando-se do perdão. Perdoar não significa esquecer, sugere, pois, uma transformação de sentimentos. Não sendo exclusivamente uma palavra de cunho religioso, perdoar, neste contexto, pode assemelhar-se ao termo aceitação, referido por Carl Gustav Jung como uma poderosa forma de transformação. É em aceitando que somos falhos que poderemos buscar a reparação daquilo que entendemos como errado, possibilitando assim, que se amenize o sentimento de culpa. Quando aceitamos também, que outros podem errar para conosco, fica mais fácil a compreensão e a solução dos problemas decorrentes. Por fim, se quando irritados com nossas falhas dirigimos certa agressividade a nós mesmos, com a aceitação (perdoando-nos), perceberemos que é possível vivermos sem culpa, ou, pelo menos, minimizando nosso estado de sofrimento.
César A R de Oliveira - Psicólogo

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Autoconhecimento

Certo dia, em um encontro, foi pedido a alguém que se apresentasse ao grupo. Ela disse: “Meu nome é X, sou profissional de tal área e...”  - quando foi apressadamente interrompida pelo interlocutor: “Foi você quem escolheu seu nome?” – perguntou-lhe, dizendo – “Você não é o nome que te deram, nem a profissão que exerce, quem é você?” . O constrangimento por não conseguir se apresentar era evidente: sexo, idade, filiação, endereço, preferências, nada servia para justificar a tentativa de apresentação. A questão é milenar; o oráculo de Delphos já propunha o conhece-te a ti mesmo. Quem pode afirmar que efetivamente tem grande conhecimento de si? O autoconhecimento é algo concluso ou passamos uma vida toda nos descobrindo? Para que serve?
            Há autores que afirmam ser este o maior desafio de nossa vida. Isto exige muito esforço, disciplina e maturidade para olharmos (e podermos reconhecer) em nós aquele lado que muitas vezes desconhecemos ou não gostamos de mostrar a ninguém, nem a nós mesmos. O grande psicólogo Carl G Jung já teorizava sobre aquilo que denominou de “Sombra”, fixada nas entranhas do inconsciente mas sempre pronta para a qualquer momento emergir, surpreendendo a todos. Um processo saudável de autoconhecimento implica em reconhecermos nossas sombras e aceitarmos-las, pois, por mais absurdas que pareçam, são partes nossas! 
            Nas terapias, é muito comum manifestações que indiquem um sujeito que quer sair de um emprego, de um relacionamento afetivo, de uma cidade, como se isto pudesse afastar de si um mal estar que em muitas das vezes não está no ambiente, no outro, mas em si mesmo. Está sentenciado: para onde ir, sua essência (o Ser) irá junto. Quando temos a oportunidade de nos conhecermos melhor, as relações com o mundo ficam menos sofridas, o choque com a realidade não é tão ameaçador, percebemos que nossas imperfeições não são muito diferentes das dos outros.  E o que acontece? Passamos a nos sentir mais seguros, não dando muita importância aos erros, evitando com isto o medo, porta de entrada para uma série de perturbações psíquicas e emocionais.
            De diversas maneiras estudos teológicos, psicológicos ou filosóficos tratam das ações do pensamento sobre o ser humano. Muitos quadros de sintomas psicopatológicos (a grosso modo chamados de doenças) referem-se sobre pensamentos, sejam delirantes, depressivos, invasivos, mágicos, de suicídios etc... Daí que praticar o autoconhecimento implica, necessariamente, em realizar mudanças de hábitos, em exercitar o bem pensar: se os pensamentos - produções próprias - são tão influentes em nossas atitudes e tomadas de decisões, devemos ter o cuidado de produzi-los com a melhor qualidade possível.
Assim, se pudermos considerar que um pensamento é um diálogo interno silencioso (mas muito poderoso), uma manifestação de nossa psique, quanto mais formos honestos e coerentes, maior poderá ser a garantia de que nossas atitudes nos encaminhem para um viver melhor, com menos conflitos e com maior sensatez. Mas esta boa qualidade de pensamentos só será possível quando estivermos prontos para respondermos à pergunta sobre quem somos, sem embaraços.

terça-feira, 1 de março de 2016

Também te amo, amigue...

Sim a grafia está correta, poderia, ainda, ser amigx ou então amige, dentre tantas variações na escrita. Mas a quem esta declaração de amor se dirige? Bem, no surgimento de um novo conceito, ela está endereçada a alguém de gênero neutro: sim, nem a um homem, nem a uma mulher, a um transexual ou a qualquer outra opção de gênero. Aos pais desta nova geração pode parecer muito confuso que a simplicidade de definições de comportamentos sexuais (ainda confundidas por muitos com genitália: macho ou fêmea) tenha deixado de ser apenas masculino e feminino, daí, o apavoramento quando procuram o auxílio psicológico numa hora destas!
          
É muito frequente que os pais queiram obrigar seus filhos a sessões de psicoterapia para “resolver este problema”, beirando quase à insanidade daqueles que propõe – e acreditam - em “cura”, como se uma doença fosse. Lembro-me de, no início da década de 2000, uma campanha publicitária de muito sucesso que apresentava à mídia a chamada “Está na hora de você rever seus conceitos...” cujas cenas baseavam-se no cotidiano de pessoas que não acreditavam em outras possibilidades para as relações interpessoais. Agora, a revista Veja em uma edição do mês de fevereiro passado, trouxe o tema à baila - matéria de capa - apontando para uma revolução de costumes da ordem da sexualidade de toda uma geração de adolescentes.
   
         Cada vez mais a mídia expõe personagens andróginos em novelas, programas televisivos, na literatura, teatro, ou seja, apenas facilita a revelação daquilo que por muito tempo foi tido como vergonhoso, imoral ou escandaloso. Estou escrevendo este artigo não sobre perversidades ou promiscuidades sexuais (como algumas mentes obsoletas possam estar imaginando), mas para tentar amenizar a causa da confusão de muitos pais: em algumas formas de pensar, o que não for masculino ou feminino é errado, por isto algumas famílias sofrem.
       
     Quem já conversou com estas pessoas que apenas querem ter o direito de uma manifestação de comportamento sexual que esteja em sintonia consigo mesmo, percebe sobre o quanto sofrem por preconceitos, ameaças (em alguns casos físicas e humilhantes) apenas por não enquadrarem-se naquilo que o senso comum chamaria de “normal”.
         
   Bem, aos pais que estejam passando por dificuldades de compreensão sobre estas manifestações de comportamento de seus filhos, recomendo, antes de qualquer atitude desastrada e que implique em grave dano psíquico a eles e às famílias, que procurem para si uma orientação psicológica. É preciso antes de tudo conhecer o mundo das novas gerações para que se possa então, travar um diálogo sincero, mesmo que seja para dizer que não concorda ou que não gosta, mas que acima de tudo, seja uma manifestação respeitosa. Lá fora está cheio de “gente” (desumanos seria uma definição melhor) que não vão tratar muito bem aqueles que se manifestem na neutralidade de gênero, porém, ao menos em suas casas, eles devem sentir-se amados, acolhidos e respeitados.

César A R de Oliveira

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Quando as mulheres bebem....

 “ Não tire da minha mão esse copo
Não pense em mim quando eu calo de dor
Olha meus olhos repletos de ânsia e de amor ”
 (Ângela Ro-Rô)

Por muito tempo alcoolismo foi considerado como um problema de homem, uma falha moral, um problema social e depreciativo onde o alcoólatra transitava entre o vagabundo, o mendigo, o pecador, ou mesmo, para as classes mais altas, o membro decaído da sociedade. Em que pesem esforços desde o início do século passado, o alcoolismo sequer era tratado como doença, o que aconteceu somente a partir de 1951 quando a Organização Mundial de Saúde o reconheceu oficialmente como uma enfermidade.
Aparentemente um problema masculino, hoje, a preocupação chega também às mulheres. Várias considerações podem ser formuladas para isto: sob aspecto biológico, as mulheres têm no estômago um menor número de enzimas chamadas álcool desidrogenase, um menor peso (se comparadas aos homens) e, conseqüentemente, menor índice de água no corpo, o que contribui para que fiquem mais rapidamente embriagadas. Dentre os aspectos psicológicos e sociais, destacam-se a necessidade de beber para melhor trabalhar ou conviver em sociedade, para compensar “ausências”, problemas financeiros, crises familiares, aliviar tensões e ansiedades, livrar-se do tédio ou da fadiga, enfim, liberar sentimentos ou vários outros pretextos.
Em que pesem as constantes mudanças de valores sociais, ficar embriagado em público, ainda é mais tolerável aos homens, pois álcool e virilidade, culturalmente, andam juntos, infelizmente. A mulher que bebe em excesso recebe mais críticas e só é tolerável se for jovem e atraente (objeto sexual fácil, inofensivo e irresponsável), pois a mulher que começa a falar mais alto, chamar a atenção e tornar-se agressiva e escandalosa, é inaceitável. Permanece a mensagem velada de que é possível às mulheres beberem, desde que não fiquem embriagadas. Que o digam Paris Hilton, Naomi Campbell, Lindsay Lohan para não estender a lista e nem chegarmos às compatriotas.
Na obra “O alcoolismo e as mulheres“ a psicóloga Jan Bauer relata várias possibilidades de abordagens às dependentes, passando pela ótica moral e também pelos antigos e modernos modelos médicos e psicológicos. Sua conclusão é a de que quando é reconhecido o alcoolismo feminino as mulheres passam por mais imorais, mais frágeis e mais doentes (dependentes) do que os homens. O sofrimento da mulher que bebe transcende a si e acaba sendo vivido também pela família. Se aumentada sua dimensão, passa a trazer transtornos sociais, legais, no trabalho e em qualquer relação, além de implicações na sua saúde. Quadros depressivos, sentimento de não ser compreendida, desânimo, baixa-estima, irritabilidade, falta de apetite e conseqüente perda de peso, além de uma série de implicações orgânicas, são apenas alguns sintomas decorrente do alcoolismo.
Há um estigma social muito forte sobre o reconhecimento do alcoolismo em mulheres, então, é comum que famílias neguem a existência de casos, principalmente se convencidas pela dependente (que também reage com negação) de que a mesma bebe “apenas socialmente”. Sempre é tempo de buscar um tratamento, um auxílio profissional, uma possibilidade de recuperar a vida. Hoje, nos EUA, cerca de 1/3 de membros dos Alcoólicos Anônimos é de mulheres.
Com relação à citação em epígrafe, rendo homenagem à cantora e compositora Ângela Ro-Rô, a qual, depois de muitos problemas por causa da bebida, encontra-se reabilitada, compondo, cantando, com um leve problema de saúde, mas, de bem com a vida. É possível uma vida boa sem os excessos da bebida.
César A R de Oliveira

Psicólogo – saude_mental@outlook.com