Não pense em mim quando eu calo de dor
Olha meus olhos repletos de ânsia e de amor
”
(Ângela
Ro-Rô)
Por muito
tempo alcoolismo foi considerado como um problema de homem, uma falha moral, um
problema social e depreciativo onde o alcoólatra transitava entre o vagabundo,
o mendigo, o pecador, ou mesmo, para as classes mais altas, o membro decaído da
sociedade. Em que pesem esforços desde o início do século passado, o alcoolismo
sequer era tratado como doença, o que aconteceu somente a partir de 1951 quando
a Organização Mundial de Saúde o reconheceu oficialmente como uma enfermidade.
Aparentemente um
problema masculino, hoje, a preocupação chega também às mulheres. Várias
considerações podem ser formuladas para isto: sob aspecto biológico, as
mulheres têm no estômago um menor número de enzimas chamadas álcool
desidrogenase, um menor peso (se comparadas aos homens) e, conseqüentemente,
menor índice de água no corpo, o que contribui para que fiquem mais rapidamente
embriagadas. Dentre os aspectos psicológicos e sociais, destacam-se a necessidade
de beber para melhor trabalhar ou conviver em sociedade, para compensar
“ausências”, problemas financeiros, crises familiares, aliviar tensões e
ansiedades, livrar-se do tédio ou da fadiga, enfim, liberar sentimentos ou vários
outros pretextos.
Em que pesem
as constantes mudanças de valores sociais, ficar embriagado em público, ainda é
mais tolerável aos homens, pois álcool e virilidade, culturalmente, andam
juntos, infelizmente. A mulher que bebe em excesso recebe mais críticas e só é
tolerável se for jovem e atraente (objeto sexual fácil, inofensivo e
irresponsável), pois a mulher que começa a falar mais alto, chamar a atenção e
tornar-se agressiva e escandalosa, é inaceitável. Permanece a mensagem velada
de que é possível às mulheres beberem, desde que não fiquem embriagadas. Que o
digam Paris Hilton, Naomi Campbell, Lindsay Lohan para não estender a lista e
nem chegarmos às compatriotas.
Na obra “O
alcoolismo e as mulheres“ a psicóloga Jan Bauer relata várias possibilidades de
abordagens às dependentes, passando pela ótica moral e também pelos antigos e
modernos modelos médicos e psicológicos. Sua conclusão é a de que quando é
reconhecido o alcoolismo feminino as mulheres passam por mais imorais, mais
frágeis e mais doentes (dependentes) do que os homens. O sofrimento da mulher
que bebe transcende a si e acaba sendo vivido também pela família. Se aumentada
sua dimensão, passa a trazer transtornos sociais, legais, no trabalho e em
qualquer relação, além de implicações na sua saúde. Quadros depressivos,
sentimento de não ser compreendida, desânimo, baixa-estima, irritabilidade,
falta de apetite e conseqüente perda de peso, além de uma série de implicações
orgânicas, são apenas alguns sintomas decorrente do alcoolismo.
Há um estigma
social muito forte sobre o reconhecimento do alcoolismo em mulheres, então, é
comum que famílias neguem a existência de casos, principalmente se convencidas
pela dependente (que também reage com negação) de que a mesma bebe “apenas
socialmente”. Sempre é tempo de buscar um tratamento, um auxílio profissional,
uma possibilidade de recuperar a vida. Hoje, nos EUA, cerca de 1/3 de membros
dos Alcoólicos Anônimos é de mulheres.
Com relação à
citação em epígrafe, rendo homenagem à cantora e compositora Ângela Ro-Rô, a
qual, depois de muitos problemas por causa da bebida, encontra-se reabilitada,
compondo, cantando, com um leve problema de saúde, mas, de bem com a vida. É
possível uma vida boa sem os excessos da bebida.
César
A R de Oliveira
Psicólogo
– saude_mental@outlook.com
Infelizmente as "long necks" acertaram em cheio a estratégia do público alvo "jovem e feminino" banalizando ainda o consumo desta "droga sociável" inclusive em vias públicas!
ResponderExcluirPois é, e não é raro em sessões de psicoterapia ver o grandes prejuízos que o consumo irresponsável de bebidas acarreta às famílias. Boa semana.
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