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terça-feira, 29 de dezembro de 2015

ANO NOVO, PESO NOVO....

Festas de final de ano têm sido boas desculpas para comilanças e excessos, e geralmente, que as preocupações com o peso fiquem para o próximo ano. No entanto é preciso que identifiquemos: qual a nossa relação (se é que existe) com a balança? Estética ou efetivamente com a saúde?
Hábitos alimentares são muito complexos e estão relacionados a questões culturais, sociais, econômicas, biológicas, afetivas, dentre outras, daí que um tratamento psicoterápico para uma eventual mudança requer uma abordagem multidisciplinar. Do ponto de vista da psicoterapia é frequente que algumas pessoas nos procurem pedindo auxílio para perder peso, ou então, para poder manter-se em um tratamento relacionado - seja pré ou pós cirúrgico - ou apenas em apoio às exigências de um nutricionista. Há uma meia verdade de que “é preciso mudar a cabeça, não ficar com cabeça de gordo (sic)...”, sugerindo que o sucesso de uma reeducação alimentar passe unicamente por uma questão de vontade e mudança de comportamento.
Estudos mostram que algumas formas de intervenções psicoterápicas influenciam nos resultados para a manutenção do novo peso, todavia, é preciso ter um cuidado personalizado, pois o que pode ser bom para uma pessoa talvez não seja para outra. Trocar um estado de ansiedade com compulsão para a comida por outra forma de compulsão que leve à anorexia, drogadição ou algum hábito nada saudável, é trocar seis por meia dúzia. Um acompanhamento por parte do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em pacientes submetidos a cirurgias bariátricas revelou que depois de cinco anos, parte significativa deles apresentava transtornos como o consumo excessivo de álcool, anorexia e bulimia. E, para a infelicidade destes, 64,15% voltaram a se tornar obesos, sendo que 13% chegaram ao estado de obesidade clinicamente severa. Somente 7,84% dos pacientes mantiveram o peso ideal, ainda assim, apresentando algum distúrbio correlato. Do Hospital das Clínicas de São Paulo, dados similares informam que 40% dos pós cirúrgicos afirmaram continuar a sentir vontade de comer em situações de ansiedade e de depressão, e que a maioria deles não inclui a rotina de acompanhamento psicológico pós operatório.
                Para quem mantém vigilância em relação ao seu peso, é preciso muita informação, disciplina e apoio quando se trata de desenvolver e cultivar novos hábitos alimentares e de comportamento para obter um novo estilo de vida. Mais do que uma preocupação estética, trata-se de uma condição de saúde e de bem estar, pois uma alimentação saudável está relacionada a bom humor, menor agressividade, melhor qualidade de relacionamentos afetivos e sociais, aumento de desempenho cognitivo/aprendizagem, menor índice de casos de depressão e tantos outros benefícios. Um acompanhamento psicoterápico é um ótimo aliado na conquista – e manutenção – destes objetivos. Só ganhos.
Feliz ano de 2016.
César A R de Oliveira
 Psicólogo – CRP 07/13.695

saude_mental@outlook.com

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

ENGANAMOS A MORTE OU NOS ENGANAMOS?



“(...)  de modo que, ao ouvirem a notícia da morte de Ivan Ilitch, a primeira coisa que lhes passou pela cabeça foi o possível efeito na rodada de transferências e promoções para eles ou seus companheiros” (Tolstoi).


Na clássica e centenária obra de Leon Tolstoi, A morte de Ivan Ilitch, o enredo trata sobre os últimos dias de vida de um magistrado da Corte Suprema da Rússia do início do século passado. Após sentir as dores de uma doença cujo diagnóstico era incerto para seu médico, Ivan Ilitch vai ficando cada vez mais enfermo e incapacitado para o trabalho e para o gozo da vida. Passa a depender dos cuidados da família (insatisfatórios e desprovidos de afetos) mas os encontra em um humilde serviçal o qual, efetivamente, lhe amparou naqueles momentos difíceis. Restrito aos seus aposentos agoniza seus últimos dias refletindo sobre como fora sua vida, que lembranças boas ainda lhe ocorriam e o que poderia ter feito para uma vida melhor. Enquanto isto, no círculo de suas relações de trabalho, as preocupações eram sobre quem tomaria seu cargo e que outros colegas poderiam ser beneficiados com isto (epígrafe).

Enredo de literatura? Não, a mesma história poderia ser transposta para muitas situações atuais. Quando no auge de sua vitalidade física, Ivan Ilitch, desgostoso de seu casamento já no primeiro ano enfurnava-se cada vez mais em seu trabalho como fuga da frustrada relação conjugal. Sua vida repleta de ocasiões carreiristas o fizera optar por promoções e transferências que julgava oportunas para sua ascensão, decisões que tomava à revelia dos interesses de sua família. Assim, ao adoecer, não encontrara no lar o respaldo que poderia ter amenizado seu sofrimento. Nos dias de hoje, são muitas as pessoas que priorizam seus estudos, trabalho e obrigações sociais para só então, em terceiro ou quarto plano incluírem no cenário suas famílias. Sob a tão surrada alegação de “falta de tempo” vão encontrando justificativas para continuarem com suas elegidas prioridades. Mas quem os socorrerá nas horas de aflições?    

Se por um lado o senso comum diz que a única certeza da vida é a morte, por outro, Sigmund Freud em seu ensaio “Nossa atitude para com a morte (1915)”, escrevera que no inconsciente cada um de nós está convencido de sua própria imortalidade. Ora, lidamos com esta dualidade simplificando-a: a morte existe nos outros, então, não devemos nos preocupar com ela. E é desta forma que muitas pessoas agem em seu cotidiano, como se imortais fossem. Não é preciso ter a morte como uma ameaça constante a reger nossas condutas, muito menos agir ou deixar de agir por um pensamento desta ordem, todavia, se tivermos um mínimo de consciência de nossa finitude poderemos melhorar nossas ações. Seria muito mais interessante se tivéssemos a vida por princípio e como justificativa para tudo. Assim, no automóvel, utilizaríamos o cinto de segurança por amor à vida e não pelo temor à multa e viveríamos mais felizes e satisfeitos se lembrássemos de que por nossos atos podemos fazer alguém feliz. Faríamos menos caras-feias e, quem sabe, saudaríamos nossos vizinhos. Muito possivelmente viveríamos melhor.

A mitologia greco-romana traz a figura do Rei Sísifo, o qual, por sua ardileza, acorrentou a própria morte e ainda enganou o deus dos infernos, conseguindo inclusive voltar de lá à vida. É claro que tempos depois chegou o dia derradeiro em que ele não teve escapatória, e pelo que fez, foi condenado perpetuamente a rolar uma pedra até o alto de uma montanha. Cada vez que chegava ao topo a pedra lhe escapava e voltava ao sopé para que reiniciasse seu árduo e infindável trabalho.

Assim como o mito, algumas pessoas enganam aos outros e a si mesmos com atitudes as quais, pensam, não terão maiores conseqüências. Todavia, em algum momento – daí a certeza da morte – ações ou omissões, poderão fazer a diferença. Então, que vivamos bem o hoje e o agora, reavaliando nossas vidas enquanto há tempo para novos rumos, fazendo o bem, sendo mais tolerantes, e acreditando que sempre há alguém que possa necessitar de nossa atenção. Boas reflexões, Boas Festas, e um ano de 2016 cheio de realizações!





César A R de Oliveira

Psicólogo
saude_mental@outlook.com

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Monja Coen em Passo Fundo

            Em setembro, no dia seguinte à chegada da primavera, esteve em Passo Fundo a monja Coen Sensei, a quem tive a oportunidade (bem como os demais que estavam no auditório lotado do IMED) de ouvir em palestra e com isto poder levar para casa ressonando em minha mente uma série de reflexões. Para muitas pessoas é inevitável a associação da palavra monge a budismo, como se a temática devesse ser unicamente religiosa. Na ocasião, dentre muito do que foi dito, fixei-me na preocupação dela com relação à imigração em massa que ocorre neste momento na Europa. Sobre o assunto, a monja nos levou à reflexão humanitária que o caso requer. Movimentos migratórios povoaram o mundo formando civilizações, propiciaram miscigenações raciais, religiosas e culturais, afinal, somos o resultado disto. Se na região sul do Brasil estão presentes descendentes de alemães e de italianos, no centro sul há a maior colônia japonesa do mundo fora do Japão, e em muitas regiões litorâneas há a predominância de afrodescendentes ou de portugueses, por exemplo. Dados oficiais de 2014 contabilizam a entrada recente no Brasil de cerca de 50 mil imigrantes haitianos, os quais, na tentativa de superar todas as barreiras preconceituosas existentes, esforçam-se para ter aqui uma vida melhor e mais digna do que aquela no país de origem.  
            Há um termo muito antigo denominado xenofobia e que serve para designar formas de aversão ao estrangeiro, quer em repulsa, em atitudes ou mesmo por preconceito. Como disse a monja, “migrar não é fácil”...  Há uma incerteza com relação ao futuro, há a necessidade de adaptação à cultura e ao idioma, além da superação da natural barreira - ainda que não explícita - da rejeição. Mas o que pode levar a alguém a não acolher um refugiado de guerra, um retirante do campo, em suma, não estender a mão a um necessitado? (lembrem-se de que há migrações internas no Brasil também). Se há um coro universal clamando por justiça social, paz, amor, fraternidade, qual o nosso papel neste momento, apenas esperar ações dos governos? É coerente estarmos sensíveis/comovidos ao que assistimos – à distância - pela televisão, enquanto permanecemos em estado de inércia e de indiferença aos muitos necessitados à nossa volta?
            Precisamos de mais pessoas que nos sensibilizem a olhar para o sofrimento humano, a nos indicar a direção do bem, da fraternidade, do amor ao próximo. Precisamos da mídia, de novelas e de noticiários que nos desacomodem acusando tais problemas e que nos deixem desconfortáveis. Talvez isto possa nos lembrar também que podemos ser pessoas ativas em alguma causa, que o nosso exemplo pode mobilizar a outros, contagiar um grupo de amigos, uma associação, uma classe, e dai sim fazermos a diferença. Gosto de uma música de Nando Cordel onde diz que a Paz no mundo começa em nós.... Não dá para nos sentirmos em paz com tantas coisas desta ordem acontecendo à nossa volta, mas podemos começá-la.


César A R de Oliveira – psicólogo

saude_mental@outlook.com

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Em setembro, Cristo Redentor de amarelo, por quê?

O Centro de Valorização da Vida (CVV) adotou o Setembro Amarelo - a exemplo de outros meses coloridos para chamar a atenção às suas finalidades – pois no dia 10 registra-se o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio. É de muita importância esta atitude, pois estima-se que em 90% dos casos os suicídios são previsíveis e possíveis de ser evitados. O tema da campanha será: “Falar é a melhor solução”, numa tentativa de motivar discussões para que se possa aprender mais sobre o assunto.
Há dados impressionantes sobre suicídio e pouco conhecidos de quem não é profissional afeto ao tema: de acordo com o Ministério da Saúde trata-se de um problema de saúde pública, pois no Brasil há uma ocorrência a cada 45 minutos, enquanto quatro outras tentativas ocorrem no mesmo período de tempo. No mundo (dados da Organização Mundial de Saúde) a incrível e nada desejável marca de um suicídio a cada 30 segundos, ou três mil por dia! Há um perfil do suicida, geralmente são pessoas com histórico de algum distúrbio psiquiátrico (90% dos casos), ou então de transtornos graves de depressão, e ainda, pessoas com alguma dependência química tanto às drogas ilícitas quanto ao álcool.  Mas o mais importante é que, em comum, muitos casos poderiam ter sido evitados se alguém tivesse dado mais atenção aos sinais do potencial suicida.
Nenhum problema ou dificuldade, por maior que possa parecer, justifica a atitude extrema de dar fim à própria vida. Tal comportamento carrega o peso de ser reprovável tanto por aspectos culturais, sociais ou mesmo religiosos. Poderia ser resumida ainda como lamentável ação egoística, pois nos casos daquelas pessoas que procuram psicoterapia após alguma ocorrência desta natureza em suas famílias, vê-se a marca que o suicida deixa através de sentimentos de impotência e de culpa aos sobreviventes.
Existe no senso comum a falsa afirmação de “... quem quer se matar não avisa...”, avisa sim. Além do suicídio consumado existem os chamados gestos suicidas e ainda as tentativas de suicídio, cada qual com suas mensagens, mas que se resumem a comportamentos autodestrutivos. O suicídio é a segunda causa de morte violenta de jovens entre 18 e 34 anos de idade; há maiores tentativas entre mulheres, mas é maior o caso de morte entre os homens; aumentam as chances entre homens com mais de 60 anos de idade; solteiros, separados ou viúvos cometem mais suicídios do que pessoas casadas ou com companheiros estáveis. Antecedentes de suicídios na família também são indicativos fortes. Há muito para se aprender sobre o assunto.
Agora, a melhor forma de auxiliar alguém evitando o suicídio – mesmo que não saibamos desta intenção – é dar-lhe atenção, escutá-lo, conversar mais, estar presente.  Num mundo onde muitos queixam-se de falta de tempo, prendem-se a smartphones e computadores, tirar um breve instante para uma conversa, uma aproximação afetiva, pode ser o significado entre a vida e a morte.
César A R de Oliveira – psicólogo

saude_mental@outlook.com

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Dietas Radicais


Durante o mês de julho, na mesma semana, duas notícias chamaram minha atenção: “Mulher morre após perder 45 kg em dieta radical” e “Fisiculturista morre de câncer no fígado após dieta cheia de proteínas”. Nos dois casos a busca pelo corpo perfeito parece ser o ponto em comum: ela, após ter sido rejeitada por um homem que lhe dissera que por ser gorda não conseguiria nada na vida, enquanto que o fisiculturista - segundo suas palavras - com o objetivo de “ficar maior o que pudesse”. Profissionais da área da saúde informam a todo o momento sobre os riscos que dietas radicais representam, tanto para aquele que pretende perder peso como para o que deseja aumentar massa corporal, e o bom senso aponta para a mesma direção: a necessidade, nestes casos, de acompanhamento profissional.
Do ponto de vista da psicologia, abordo a temática referindo-me à autoestima. Nos casos acima, bem evidenciados de que ambos estão insatisfeitos com a imagem corporal e buscam uma transformação de maneira absolutamente errônea: querem uma mudança em suas aparências (exterior) enquanto que deveriam dialogar consigo mesmo para que a primeira transformação ocorresse na instância interior. De forma simplificada, autoestima pode ser definida como aquilo que pensamos a respeito de nós mesmos e que repercute em nossas relações afetivas, sociais e profissionais. Também está relacionada com a autoimagem que fazemos e, por conseguinte, sobre como ela interfere em nossas vidas.
Pessoas com autoestima saudável são capazes de valorizar pequenas conquistas, de diversificar interesses, desempenhar diferentes papéis, e atuar bem nas relações familiares, profissionais e de amizades, além de manter uma boa autonomia em suas vidas. Tais aptidões são benéficas à medida que viabilizam a aceitação social, pois, do contrário, um sentimento de rejeição viria acompanhado muitas vezes de comportamento depressivo, de menos-valia e de ojeriza à própria imagem. A desvalorização social interfere nos mecanismos de autocontrole que permitem enfrentar desafios novos de forma equilibrada. Em 1930, ao escrever sobre O mal estar na civilização, Freud disse que um dos grandes obstáculos do homem em sua busca pela felicidade, e que lhe traz maiores dificuldades, é o sofrimento resultante das relações humanas.
Pessoas que sentem-se atingidas em sua autoestima podem perder o domínio de si e a vontade de se esforçar, sentindo-se limitadas e com a impressão de que os que estão à sua volta ficam lhes observando (e a seus defeitos) o tempo todo. Valorizar as próprias qualidades e saber de suas limitações, podem ser ferramentas imprescindíveis ante a situações de crise ou de fracasso, todavia, o mais importante é não isolar-se ou ficar centrado no próprio sofrimento, é preciso ver outras possibilidades.
 A busca pelo autoconhecimento e o melhor ajustamento da autoestima como ferramenta de grande utilidade nas relações sociais, possibilitaria um melhor convívio em grupo e nos fortaleceria na persistência diante do fracasso, além do que, o relacionamento saudável conosco mesmo nos possibilitaria maior felicidade. Assim, eventuais insatisfações com relação ao próprio corpo seriam, antes de tudo, motivos de reflexão para que se buscasse uma solução da maneira mais saudável possível.

César Augusto – psicólogo

saude_mental@outlook.com

terça-feira, 7 de julho de 2015

Facebook: a invasão consentida

Na última edição da revista Superinteressante (Ed. Abril, jun/15) foi apresentada uma reportagem com muitas informações sobre o Facebook, das quais, algumas desconhecidas em sua maioria. Escrevo sem a pretensão de criticar tal rede social ou seus participantes, onde me incluo, pretendo apenas levar à reflexão sobre alguns aspectos psicológicos sugeridos naquele artigo e que podem afetar alguns usuários. Para começar, há mais pessoas com contas nesta rede (1,4 bilhão) do que aquele que se estima ser o número de católicos existentes no mundo (200 milhões a menos). Estudos de universidades (Michigan, EUA e de Leuven, Bélgica) concluem que alterações no comportamento humano podem ser decorrentes do uso excessivo da rede, tais como aumento de impulsividade, aumento de comportamento narcísico, maior desatenção e despreocupação com os sentimentos dos outros, o que torna muitas pessoas mais infelizes. Quanto maior o tempo de permanência conectado maior a infelicidade, o que não para por ai: sentimentos de inveja (imagine você no trabalho - 15hs da tarde - vendo fotos de algum amigo em uma viagem a um local paradisíaco...), também a sensação de fracasso por não poder “fazer” tantas coisas boas como as que vê postarem, além de ódio, revolta ou intolerância com postagens de pontos de vista opostos ao do usuário no que tange a religião, política, futebol, sexualidade... e por ai afora. Outra informação importante na revista é a de um estudo longitudinal de 30 anos (chama-se assim aquela pesquisa que dura anos a fio) e que abrangeu o incrível número de 14 mil estudantes universitários – só por isto se vê a profundidade da pesquisa – o qual traz esta impressionante informação: jovens da geração atual, os quais cresceram utilizando internet, tem 40% menos empatia do que os jovens de três décadas atrás. A explicação, é a de que “... na vida online fica fácil ignorar as pessoas quando não queremos ouvir seus problemas ou críticas – e, com o tempo, esse comportamento indiferente acaba sendo adotado também na vida off-line.” (Superinteressante jun/15).
Apenas ficando com estas poucas informações, podemos perceber o quanto um sistema pode influenciar no comportamento humano e nas relações sociais, além de ser um potencial agente estressor ou gerador de sofrimentos. É muito importante que tenhamos consciência de que nosso tempo – aquilo que muitos reclamam sempre estar em falta – é cada vez mais invadido e nos tirado, se assim o permitirmos. Anos atrás, ficar na “rede” exigia sentar-se frente a um computador e uma linha telefônica fixa, depois, notebooks, tablets e wireless nos deram movimento. Atualmente com smartphones e sinal de celular tais limitações quase desapareceram.
Mas como diz o ditado, onde a diferença entre o remédio e o veneno é apenas a dosagem, que saibamos utilizar tal ferramenta virtual e que isto nos facilite a dar um oi a um amigo e combinarmos um café, para um verdadeiro encontro com trocas de abraços e de sentimentos. Que procuremos nossa felicidade em nossas atitudes, e não nas fotos e sorrisos em cliques (muitas vezes, vários cliques até se conseguir a foto ideal).  Procure dar atenção a seus sentimentos, são realmente necessários? Justificáveis? Você escuta reclamações das pessoas com as quais convive no trabalho ou na escola? Precisa olhar a rede a cada intervalo que tem, deixando de fazer outras coisas que seriam importantes? Efetivamente, tem com quem conversar, expressar sentimentos, confiar uma conversa mais íntima? Tem um ombro para um afago?
Nada substituirá um encontro com um amigo, sorrisos, atenção dirigida unicamente ao momento (ao contrário das redes onde se deixa uma TV/som ligados, olha-se simultaneamente o telefone e abrem-se caixas de diálogos para conversas paralelas). Está na hora de parar, deixar a pressa de lado, viver e observar o momento. Não é à toa que se diz que o tempo passa rapidamente demais, afinal, alguns nem estão percebendo o que fazem com ele.

César A R de Oliveira

Psicólogo – saude_mental@outlook.com

quarta-feira, 27 de maio de 2015

12 de junho, Dia dos Matemáticos

O título está correto: é para esclarecer para você que o Dia dos Namorados pode ser muito bem comemorado também como um resultado matemático. Foi destaque em algumas revistas no mês de maio, a notícia de um site de palestras na internet com o título The Mathematics of Love (sem dublagem ou legenda em português) onde a autora faz o maior sucesso “ensinando” fórmulas matemáticas para encontrar o par ideal. A tentativa, por vezes bizarra, baseia-se em estudos e pesquisas sobre como algumas pessoas encontram seus pares nos dias de hoje. Sites de relacionamentos - tais quais os existentes no Brasil - são atualmente responsáveis por um terço dos casamentos entre norteamericanos e início de muitas tentativas de namoro por aqui. Se o amor, muito identificado com a poesia e a literatura agora passa pelo viés matemático, não dá para esquecer também que houve no passado tentativas da biologia em explicar as atrações entre pessoas por meio de químicas hormonais, da antropologia por estudos sociais, e até mesmo da psicologia através do comportamento humano.
Agora, mais do que apegar-se a uma teoria para encontrar um grande amor, é preciso estar apaixonado por si mesmo, ter boa autoestima e valorizar-se. Pessoas que não encontram prazer em suas atividades, nos relacionamentos sociais ou no trabalho, dificilmente sentir-se-ão bem ao lado de alguém. Não dá para apostar na possibilidade de que encontrando sua “cara-metade” será feliz, unicamente por que não deve ser o outro quem nos faça feliz. Fosse assim, a vida sem o outro seria uma eterna infelicidade. Compartilhar momentos, conversar, divertir-se, empenhar-se junto e comprometer-se com a pessoa amada são apenas algumas formas de bem viver o Dia dos Namorados. 
Ao mesmo tempo, o apelo midiático de que devemos ter alguém para presentearmos, para sairmos juntos, para curtir a data (dando a clara impressão de que quem está sozinho está errado) deve ser visto com cuidado: se por um lado a clínica da psicoterapia nos traz pessoas tristes por estarem sós, traz também outra gama de pessoas igualmente tristes mesmo estando acompanhadas, sejam por casamentos, noivados ou outros compromissos dos quais sentem-se incapazes em terminar.
Se você encontra-se no grupo de pessoas que por algum motivo não tem alguém com quem comemorar esta data, não sinta-se inferior por isto. Reflita, tente responder à pergunta: Sou obrigado a estar com alguém? De bom grado que a resposta seja “não”, estar obrigado a uma relação não é sinônimo de bem estar ou de alegria.
Sempre que posso refiro-me ao termo SOLITUDE, a atitude de estar só, por opção, por fazer bem e propiciar uma reflexão. Então não se constranja se no Dia dos Namorados você está só; reflita, avalie sua vida, procure entender qual o significado em ter alguém ao seu lado, e, quando sentir-se fortalecido abra-se às possibilidades, seja menos exigente consigo mesmo e permita-se conhecer alguém – e ser conhecido. Mais do que questionar-se sobre o que um namorado pode dar à sua vida, prepare-se para responder o que você tem a dar a um relacionamento. Quando exigimos muito, esperamos muito e não nos satisfazemos, por outro lado, se estamos na condição de dar algo nos sentimos compelidos a pelo menos tentar dar o que de melhor tivermos.   

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Homossexualidade, Psicologia e Espiritualidade

Mês passado, no município de Soledade, assisti a uma palestra muito bem proferida pelo meu amigo professor Hercílio Quevedo, cujo tema - por vezes tabu - era o da homossexualidade. O que tornou a apresentação diferenciada foi uma explanação sob a ótica da espiritualidade, uma vez que é sabido que o modelo científico de Saúde aborda o sujeito com o viés biopsicossocial, orientando para que nestes campos sejam envidados esforços para o tratamento e as intervenções de saúde. Porém, há tempos que em meu trabalho como psicólogo incluo também uma atenção voltada à espiritualidade (o modelo biopsicosocioespiritual), o que não significa necessariamente uma intervenção fundamentada em alguma religião. Pouca gente sabe que a Organização Mundial de Saúde através de uma resolução publicada na Emenda da Constituição de 7 de abril de 1999 da própria Organização, propôs incluir o âmbito espiritual no conceito multidisciplinar de saúde, o qual agrega, ainda, aspectos físicos, psíquicos e sociais.
Mas o que se entende por espiritualidade? Dentre algumas definições cito duas, extraídas da Revista Brasileira de Educação Médica (volume 34 número 4, Rio de Janeiro Out/Dez. 2010): “Espiritualidade se refere a um amplo domínio da subjetividade humana, refletindo nos valores e ideais mais preciosos das pessoas, assim como o senso de quem são, as suas crenças, o significado e o propósito de suas vidas junto à conexão que elas estabelecem com os outros e com o mundo em que vivem.” e “Espiritualidade representa o meio pelo qual nós encontramos um sentido para tudo, além de esperança, conforto e paz interior em nossas vidas”.
De forma leiga e muito sucinta, homossexualidade humana tem referências biológicas quando a ciência aponta, por exemplo, como sendo de origem genética; tem referências psicológicas quando baliza que no desenvolvimento psíquico há uma “confusão” de gênero sexual; ainda, apenas como ilustração da homossexualidade como possibilidade de origem social, de que o meio em que se vive é determinante para a definição sexual. Sobre este modelo biopsicossocial é que a maioria expressiva dos profissionais da área da saúde estuda e trabalha as diversas situações pelas quais possam passar os homossexuais.
Ter assistido ao professor Hercílio explanar sobre aspectos espirituais relacionados ao tema, fez-me refletir mais uma vez sobre a necessidade da atenção que homossexuais e familiares devem ter. Considerando que vivemos em um mundo muito “normatizado” (lembrem que normas são regras culturais, o que serve para uma cultura pode não ter o mesmo valor para outra) e onde o homossexual é visto como algo normal/anormal, seria muito mais interessante que os tratássemos então como algo natural, produto da Natureza, origem de todos nós. Por fim, uma citação da revista médica em epígrafe pode conciliar o tema da palestra com o que escrevi neste artigo e da maneira como trabalho: “Considerando que os estados de doença provocam uma ruptura nos aspectos biológicos, psicológicos, sociais e espirituais dos pacientes, as ações de cura deveriam atender a todos esses fatores. Alguns estudos demonstram que muitos pacientes gostariam que os profissionais de saúde abordassem as necessidades espirituais deles...”
César  A R de Oliveira – psicólogo

saude_mental@outlook.com