“Doutor, o
senhor não acha melhor eu esquecer o meu passado, tão traumático, em vez de
lembrá-lo?”
No final deste mês a profissão de
psicólogo completará 51 anos de regulamentação da atividade no Brasil. A data, 27
de agosto, é uma referência ao dia em que foi promulgada a Lei 4119/62 e que
trata do exercício profissional.
De acordo com a Classificação Brasileira
de Ocupações (CBO) do Ministério do Trabalho e Emprego, a função de psicólogo
está definida como a que “... estuda, pesquisa e avalia o desenvolvimento
emocional e os processos mentais e sociais de indivíduos, grupos e instituições...”,
daí sua aproximação com o ser. Em outras palavras, é no exercício diário que se
vislumbram as dificuldades desta profissão, quer sejam pelas resistências de
toda a ordem de quem procura ou é encaminhado a um atendimento clínico ou mesmo,
às existentes no âmago das instituições e outros locais de trabalho onde o
psicólogo esteja presente. Ainda que os preconceitos estejam diminuindo, não é
raro ouvir manifestações de que psicólogos sejam para os outros, menos para quem
indique.
O fato é que cada vez mais doenças ditas
da modernidade como estresse ou depressão estão causando faltas ao trabalho, à
escola, compromissos, ou então, a manifestação de seus sintomas acabam
prejudicando relacionamentos sociais ou afetivos, resultando em brigas de
casais, separações ou conflitos entre pais e filhos, por exemplo. Mas, enquanto
se olhar apenas para os sintomas, muitas pessoas vão consumindo “remédios” para
poder dormir, diminuir ansiedades ou sentirem-se mais relaxadas. E sobre o
sintoma, há o clássico exemplo do motorista que, enquanto dirigia, ao ver uma
luz vermelha no painel de seu veículo acender, preocupado, para em uma oficina
para os devidos reparos. Fica atônito ao ver o mecânico cortar o fio daquela
lâmpada e arrancá-la, dizendo-lhe que não se preocupasse, pois esta não
acenderia mais.
Ir além do sintoma, buscar o
entendimento sobre o que lhe tira o sono ou então o que lhe deixa tenso (o que
fez a luz vermelha acender), significa dar um grande passo em direção ao autoentendimento,
para enfrentar coisas que por vezes preferimos não ver. De grande expressão no
meio psicanalítico, o gaúcho David Zimerman em seu livro Vivências de um Psicanalista relata quase uma centena de casos de
atendimentos que servem de norte para todas as formas e técnicas
psicoterápicas, pois acima de tudo, apresenta relatos de uma profissão que lida
com o ser humano, com seus sentimentos. Da obra, citei - em epígrafe - o título
de um capítulo no qual relata sobre uma pessoa que o procurou para atendimento e
que lhe fizera aquela proposta: esquecer. Em resposta, ouviu do eminente
psicanalista de que a melhor forma de esquecer é lembrar. E este é um dos fundamentais
princípios psicoterápicos.
Assim, do rol de atribuições que a CBO
venha a elencar como sendo do fazer psicoterápico, a essência é considerarmos
que se trata de uma relação humana única, onde confiança e respeito mútuo devem
preponderar e o permitir-se falar seja mais do que um simples desabafo, seja
uma via de fazer. Se de todo o trabalho for possível a reconstrução de uma
pessoa mais madura, capaz de poder enfrentar as dificuldades do cotidiano com
melhor desenvoltura, então, a possibilidade de que esta efeméride de finais de
agosto mereça ser comemorada passa a fazer sentido.
Parabéns a todos (as) colegas
psicólogos.
César AR de Oliveira – psicólogo